“Reforma política” é uma expressão habitualmente usada pelos políticos em momentos de crise. O uso contínuo e abusivo, como detergente capaz de limpar os males do sistema, foi desbotando seu significado. No ano passado, o Congresso aprovou mudanças nas regras eleitorais e partidárias. A proposta começou ambiciosa, mas acabou reduzida a alguns pontos, sendo o mais importante a restituição da cláusula de barreira, exigindo dos partidos percentuais mínimos de votação em todo o país. Nas eleições de outubro passado, trinta partidos conseguiram votos para a Câmara, mas pelo menos 10 foram alcançados pelo mecanismo, gatilho para uma reorganização que já está em curso.
Mesmo que os planos esboçados por dirigentes nessas primeiras conversas prosperem, o Congresso ainda ostentará um quadro surreal, com mais de vinte legendas representadas. Certamente, não espelham vinte ideologias, sobretudo no momento em que o país fala sobre comunismo – enterrado em 1989, debaixo do Muro de Berlim – como se fosse uma novidade deste século XXI.
Mais que um problema para os governantes que precisam negociar com o Congresso, a proliferação de partidos é uma deformação com alto custo político. Dificulta a formação de maiorias e pode inviabilizar debates mais profundos – caso da reforma da Previdência. Como já definiu o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, as legendas tornaram-se corporações, especialmente depois do fim do financiamento eleitoral com dinheiro privado.
O PSL de Jair Bolsonaro espelha a distorção. Saiu de cinco para 52 deputados. Em São Paulo, a deputada estadual eleita Janaína Paschoal obteve mais de dois milhões de votos pela legenda, feito inédito.
Na segunda-feira (19) Fernando Henrique, por meio do Twitter, disse que os partidos “devem se refazer” com novas alianças, “corrupção zero” e sintonia com movimentos sociais. A tarefa não é trivial, apesar de urgente, se os políticos e a sociedade entenderem que os partidos políticos são um canal importante de representação, não um cartório. Movimentos de renovação política como Agora!, Acredito e RenovaBR tiveram relativo sucesso eleitoral, mas seus candidatos se espalharam por diferentes legendas.
Encontrar ideias-força de coesão para iniciar esse debate pode ser uma das primeiras tarefas do novo Congresso. O atual sistema, como provou a eleição, está em ruínas.
P.S. Diz o ditado que política é como nuvem. Para comprovar o dito, Michel Temer, já quase habituado ao ruído das vaias, não escondeu o sorriso ontem, no Planalto, com os gritos de “Fica, Temer”, numa solenidade com prefeitos. Foram breves, mas deram ao presidente mais impopular da História do Brasil um ar renovado.