Adoro futebol. Aliás, deveria dizer que sempre adorei futebol porque ele era o esporte das multidões, como anunciavam antigos locutores de rádio.
Não sei se foi em Nelson Rodrigues ou num texto, ou numa conversa qualquer, publicada por Chico Buarque, que entendi a magia da “geral”. Aquela estreita faixa rebaixada, ao redor dos campos, que abrigava os que não podiam pagar sequer o ingresso para a arquibancada, mas que não deixavam de, pelo menos, vislumbrar as canelas de seus craques pelos espaços do parapeito na murada…
Cadê o povo?
E foi assim que compreendi – eu que não perdia jogo algum – aquela dança estranha da multidão que ali se apinhava, correndo pra lá ou pra cá ao sabor das idas e vindas da defesa ou do ataque de seus times prediletos.
Foi na penúltima rodada da Copa das Confederações, em 2013, assistindo a um jogo realizado no Estádio da Fonte Nova, que estranhei, pela primeira vez, não ver nem um negro no meio da torcida. Em plena Bahia!?
Grã-finos, uni-vos
Em seguida, na final no Rio de Janeiro, foi que percebi que, de joelhos, constritos às ordens da FIFA, os responsáveis pelos estádios brasileiros de futebol haviam expulsado os pobres de seus miseráveis lugares. Em plena era petista!
Pelo estilo dos que estavam em campo, vi que haviam conseguido transformar o Maracanã em Jockey Club, tamanho o luxo das roupas das “grã-finas de nariz de cadáver”, parafraseando mestre Rodrigues.
A fina flor do rentismo
Agora, vejo que, ansioso para testar se o Ministro Sergio Moro continua incólume sua carreira de justiceiro e símbolo maior da era Bozo, o presidente decidiu levá-lo ao Maracanã. Mas não apenas à tribuna de honra. O Presidente desejou pôr Moro a seu lado, no meio do campo, a fim de escutar o urro da multidão compacta.
Brasil e Peru disputaram a final da Copa América. Pena que não tenha sido Brasil e Argentina – nosso mais antigo e predileto adversário… Mas, sem sombra de dúvida, teste de popularidade maior que esse só mesmo a abertura das urnas em eleição presidencial.
Só que Bozo achou que aquele público lá era gente “do peito”. O ingresso mais barato custava quinhentos reais e o mais caro quatro mil reais.
Ricos aplausos
Ou seja, de novo, o Maracanã tinha virado Jockey Club e, como em todas as pesquisas de aprovação do governo dele, os mais ricos (nem sempre mais letrados – olhem lá!), dão-lhe apoio ou, pelo menos, o benefício da dúvida; e, na dúvida, viria, sem dúvida, um aplauso ensurdecedor…
Quem parece não ter gostado da brincadeira foi o Posto Ipiranga, que manteve uma cara de zangado que ele não costuma ter quando está na sua turma.
Poucos aplausos, algumas vaias… Embora, na “galera”, estivesse a fina flor do rentismo, que pouco se lixa para o pibinho brasileiro.
A fina flor no Brasil de Bozo é aquela que acha que patriotismo é trajar a camisa da CBF, cujo conceito moral deixa a desejar, e não vai querer, jamais, a volta da “balbúrdia petista”.
* Sandra Starling é advogada e mestre em Ciência Política pela UFMG