Alguém precisa avisar a Bolsonaro que quem não sabe brincar não desce pro play. Nessa quarta-feira (27), durante entrevista ao programa Pânico da rádio Jovem Pan – uma das poucas mídias favoráveis ao bolsonarismo -, o humorista André Marinho provocou o capitão perguntando sobre “rachadinhas” no estado do Rio de Janeiro. Mesmo sem citar o nome do senador Flávio Bolsonaro, o filho 01, o presidente se irritou e abandonou a entrevista acusando o golpe.
O episódio serviu para mostrar que Bolsonaro não aguenta um debate sério. Na primeira pancada mais firme que levar de algum adversário durante a campanha eleitoral, certamente vai se desestabilizar. Talvez a saída seja desistir de disputar a reeleição, cumprindo, assim, a promessa que fez em 2018 de que não seria candidato, ou providenciar um outro incidente como a facada, para se livrar de responder a tantas questões incomodas que vão aparecer pelo caminho.
Bolsonaro sabe que não poderá fugir de todos os debates e entrevistas aos quais os candidatos são convidados e devem participar. Afinal, o povo precisa conhecer as propostas e ideias de quem está se propondo a governar o país. Tampouco ele poderá se limitar a falar apenas para os devotos no cercadinho. Seu maior desafio será romper a bolha e tentar conquistar os indecisos, garantindo, pelo menos, uma vaga no segundo turno.
Sem querer minimizar a “rachadinha”, que é crime de peculato, mas qualquer político com um mínimo de capacidade de articulação já teria resolvido esse problema no nascedouro. Embora seu filho tenha sido envolvido, os primeiros relatórios do Coaf mostraram que representantes de todos os partidos políticos da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro eram adeptos da divisão de salários de assessores.
Essa prática é comum na imensa maioria das casas legislativas Brasil afora, inclusive no Congresso. Até os postes da Esplanada sabem disso. Não fosse assim, por qual motivo um único senador precisaria nomear mais de 50 assessores comissionados, como já foi noticiado? Ou por que os deputados têm direito, além dos 25 cargos de secretário parlamentar por gabinete, a nomear pessoas em Cargos de Natureza Especial (CNE) nas comissões, lideranças e na mesa da Casa? Por isso, nunca ninguém tratou a questão de forma séria. No fundo, não interessa à grande maioria do parlamento apurar os casos de rachadinha.
Mas Bolsonaro não soube contornar a situação e cada vez que alguém fala sobre o assunto perde o prumo. Desta vez, o presidente vestiu a carapuça e, além de não responder, acusou o pai do humorista, o empresário Paulo Marinho, primeiro suplente do 01, de estar interessado em assumir a vaga de Flávio no Senado.
A resposta não tardou. Em um vídeo postado nas suas redes sociais, Paulo Marinho fez questão de dizer que quem quer a vaga de Flávio é o Ministério Público. Ele aproveitou para deixar um recado ao presidente em tom de ameaça: “Você lembra do nosso amigo Gustavo Bebianno? Talvez você tenha esquecido dele, mas ele não lhe esqueceu, pode ter certeza disso. Quando você estiver chorando no banheiro do Palácio, lembre dele, capitão. Ele não lhe esqueceu”.
Esses fantasmas do passado tendem a aparecer de vez em quando e em véspera de eleição eles assombram ainda mais. Bebianno, que coordenou a campanha de Bolsonaro em 2018 e faleceu em março do ano passado magoado com o presidente, sabia muito. Paulo Marinho deixou claro que sabe também e insinua que “alguns segredos” não foram para o túmulo com o ex-ministro.
Talvez Bolsonaro tenha motivos para estar nervoso. No Judiciário, o TSE está julgando uma ação contra a chapa do presidente, acusada de fazer disparos em massa de mensagens em redes sociais. Mais do que ameaça a seu atual mandato, o que ali se delineia é um controle mis rigoroso das fake news na campanha de 2022. Já no Legislativo o que o atormenta é o relatório da CPI da Pandemia, que pediu ao STF a quebra do sigilo telemático do presidente além do seu banimento das redes sociais.
Apesar de ter sido tachada de “palhaçada” por Bolsonaro, ele sabe que a CPI da Pandemia dará muita munição aos adversários na campanha eleitoral e servirá de base para questões incômodas ao presidente. Ele também vai ter que suar a camisa para explicar o aumento da inflação, do desemprego, as mortes provocadas pela covid-19 e a demora na aquisição das vacinas, além de todas as bobagens propagadas durante a pandemia.
A lista de questões é interminável e o presidente sabe que será a Geni da campanha. O alvo preferencial de todos os candidatos. E não vai ser fugindo ou se irritando que vai conseguir convencer os eleitores. Esse tipo de reação só piora a situação.
Bolsonaro vai precisar mais que uma facada para conseguir convencer os eleitores que não fazem parte do seu fã-clube a votarem nele mais uma vez.