Namorando a morte

O indisfarçável gosto por sangue

Na portaria do Palácio Alvorada, o padre faz oração com um dos apoiadores de Bolsonaro que viajou a Brasília para participar, nesse domingo na Esplanada dos Ministérios, de carreata de apoio a Bolsonaro. Só puderam vê-lo de longe, no desembarque do helicóptero que o levou à cidade de Cristalina, em Goiás - Foto Orlando Brito

Muitas vezes, a melhor maneira de explicar o óbvio é lançar mão de coisas óbvias. Quem participou do movimento estudantil na época da ditadura, e mesmo depois, foi apresentado ao manifesto/poema “No caminho com Maiakóvski”.

Na primeira noite, eles se aproximam e roubam uma flor
do nosso jardim.
E não dizemos nada.
Na segunda noite, já não se escondem:
pisam as flores,
matam nosso cão,
e não dizemos nada.
Até que um dia,
o mais frágil deles
entra sozinho em nossa casa
rouba-nos a luz e,
conhecendo nosso medo,
arranca-nos a voz da garganta.
E já não podemos dizer nada

O texto foi aplicado em cartazes e camisetas. Uma febre. Na minha primeira casa tinha um cartaz emoldurado a decorar a pequena sala. E estava lá assinado: Maiakóvski. O que lhe emprestava um sentido ainda mais revolucionário. A autoria do poema era sempre atribuída ao escritor de vanguarda soviético Vladimir Maiakóvski (1893–1930). Na realidade, o verdadeiro autor é um brasileiro: Eduardo Alves da Costa, nascido em Niterói, Rio de Janeiro.

Até hoje tem gente que duvida da verdadeira autoria. É o típico caso em que a versão superou o fato. Mas deixemos o caso de lado e vamos ao que motivou a lembrança do texto: o momento escroto pelo qual o país atravessa.

Como não associar o texto às agressões promovidas pelos fanáticos adeptos do capitão?
Ninguém pode dizer que está surpreso com essas atitudes violentas, agressivas e canalhas dessa rapaziada. Não mesmo. Eles, os bolsonaristas, sempre namoraram, louvaram e apoiaram a morte, gostam de ver sangue, e têm adoração a bestas-feras. Não são gado. A manada que caminha para os pastos ou bebedouros o faz sem contrariar a natureza, de maneira dócil. Os fanáticos não são assim.

O método deles é a crueldade. Afinal, o mito deles sempre flertou com a morte. Quando tenente, quis explodir um quartel; como deputado, atacava os colegas com grosserias verbais inqualificáveis; sempre abrandou os assassinatos ocorridos na ditadura, dizendo que morreram poucos e que deveriam morrer mais de trinta mil; defendeu na tribuna o mais sanguinário dos torturadores do regime militar, o tal Brilhante Ustra, que vale a pena ter o nome repetido para que futuras gerações saibam que o país produzia carniceiros; defende as armas como solução para tudo.

Os caminhos da política e da democracia, ressalte-se, levaram o capitão lesa-humanidade ao mais alto cargo do país. Investido de poder, passou a colocar em prática a agenda macabra que sempre norteou a própria trajetória. Tudo o que pode representar um marco civilizatório, ele é contra. Tudo que pode redundar em morte ou extermínio, como o dos índios, ele é a favor. Até o aumento das mortes nas estradas ele incentivou.

Os adeptos do capitão são assim porque são iguais. Ele é o guia. Louvam Deus e torturadores, falam em Cristo e elogiam Pinochet. São nazistas, fascistas, genocidas. Não são gado. São canalhas e covardes. E o chamam de mito porque se enxergam em tamanha excrescência. Agora, no momento, tratam de justificar e passar a mão na cabeça de quem agrediu enfermeiros e jornalistas. E, não satisfeitos, ainda transformaram as cores do nosso país em símbolo do fascismo. Escrotos, devolvam a nossa bandeira.

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