Com alguma frequência, vejo pela cidade – em viadutos, notadamente – um pequeno cartaz com uma quase súplica: Mais amor, por favor. Não sei sua origem ou autoria. Já ouvi falar até que seria uma “palavra de ordem” de determinado grupo. Não sei, só achava uma frase ingênua, meio bobinha.
Mas faz dias que ela não me sai da cabeça. A cada palavrão que ouço de uma autoridade – o presidente à frente, sempre –, a cada xingamento, termos agressivos (ah, ele tomou uma invertida”, repetem com júbilo nas redes sociais), ataques ou resposta atravessada, a frase volta. Também me lembro do meu avô, que mal tinha o curso primário e vivia na roça, a insistir com os netos: tenham modos! E acrescento a participação da minha sábia mãe: o exemplo vem de cima.
Não se trata de moralismo. E nem é preciso que as autoridades dispensem umas às outras o tratamento de excelência, o que muitas vezes soa a pura hipocrisia. Mas se as excelências se tratam na base do linguajar de cais do porto, com chutes na canela, por que os outros não o fariam
De qualquer maneira, é muito empobrecedor para o debate que ele seja feito nesses termos. Mais ainda com a carga preconceituosa que os filhos do presidente e seus seguidores costumam emprestar aos seus – literalmente – curtos e grossos comentários. Definitivamente, eles não servem de modelo.
Infelizmente, os maus tratos à língua portuguesa e às normas de boa educação não se restringem a eles. Recentemente, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, geralmente com espírito brincalhão, começou um post com um sonoro “Porra!”. Precisava? Palavrão é ótimo de se usar, costuma sintetizar o que seria escrito em muitas linhas ou dar a exata dimensão do que se está pensando. Mas tudo tem hora e lugar, não?
A questão principal é que o debate político, seja feito por parlamentares e outras autoridades, ou por pessoas comuns, já está muito ruim, limitado, fraco, pobre. Se, além da falta de ideias, ele se restringe a xingamentos, fica mais difícil ainda de existir.
O objetivo, além de desqualificar o oponente, parece ser o de interditar a conversa. É impossível que ela continue após duas ou três frases – ou posts, que é a maneira mais usual.
Não se quer defender aqui uma linguagem de punho de rendas. É que para debater o que realmente é necessário para se reconstruir o país será necessário o mínimo de domínio da língua, das ideias, das propostas. Até para que elas sejam comparadas, é preciso partir de um outro patamar.
Posso estar sendo bobinha, meio Poliana – como a frase do pequeno cartaz sempre me pareceu. Ou antiga, ou baixou o espírito mineiro, à la Tancredo Neves, pedindo por bons modos e compostura (alguém ainda se lembra desta palavra?).
Posso ainda estar contaminada pelo espírito destes poucos dias, o interregno entre o Natal e o Ano Novo. Quem sabe?
Então, aproveito para desejar a todos leveza e força em 2022. Vamos precisar de ambas.
Feliz Ano Novo.