Quem conhece a trajetória do Partido Comunista Brasileiro (PCB), sabe que a proposta da luta de classes jamais encontrou terreno fértil entre nós. A nossa História registra lances de violência na Guerra do Paraguai, na Revolução Farroupilha, no massacre de Canudos. As chamadas revoluções, entretanto, não terminaram com sumário fuzilamento dos vencidos. Na pior das hipóteses cassações de mandatos, de direitos políticos e alguns anos de exílio, encerrados com anistia ampla, geral e irrestrita. Nunca sofremos algo comparável à Guerra da Secessão americana, à Revolução Russa de 1917, as revoluções mexicanas do começo do século 20, à Guerra Civil espanhola na década de 1930.
Luís Carlos Prestes, o Cavaleiro da Esperança, é figura controvertida. Capitão do Exército renunciou às dragonas, rompeu com os companheiros revolucionários, repeliu as propostas de aliança para seguir sempre sozinho. A Intentona Comunista de 1935 é exemplo de aventura mal planejada, mal comandada e mal sucedida. Ao tentarmos conhecê-lo nos deparamos com personalidade soturna, irascível, incapaz de pensar além dos limites da dogmática marxista-leninista. Como líder da esquerda radical foi mau estrategista. Leiam-se os Revolucionários de 1935, de Marly de Almeida Gomes Vianna, com o revelador subtítulo Sonho e Realidade (Editora Expressão Popular, SP, 2007); Prestes: Lutas e Autocríticas, de Denis de Moraes e Francisco Viana (Editora Vozes, RJ, (1982); O Partido Comunista Brasileiro (1922-1964), de Eliezer Pacheco (Ed. Alfa-Omega, SP, 1984). A maior façanha do Cavaleiro da Esperança consistiu no comando da Coluna que leva o seu nome. Após percorrer milhares de quilômetros, para escapar à perseguição do Exército, internou-se na Bolívia onde foi dissolvida.
O comunismo e o socialismo jamais conseguiram a adesão das classes trabalhadoras. São partidos de quadros cujas utopias atraem intelectuais, poetas, artistas, mas não reúnem seguidores vindos do chão das fábricas. Basta examinar os resultados eleitorais colhidos por partidos de extrema esquerda ou direita. Em 1945, ao se convencer de que não conseguiria evitar a redemocratização, Getúlio Vargas patrocinou a criação de dois partidos: o Partido Social Democrático (PSD), de perfil conservador, e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), vagamente esquerdista, apoiado na mística da legislação social corporificada na Consolidação das Leis do Trabalho. Décadas depois Luís Inácio Lula da Silva rejeitou o PCB e o PTB para criar o Partido dos Trabalhadores(PT) e vencer quatro eleições presidenciais.
Trabalhismo, udenismo, pessedismo, comunismo, socialismo, petismo, pertencem ao passado. Hoje o Brasil se divide em duas facções: bolsonaristas e antibolsonaristas. É prematuro tentar decifrar o que se passa no âmago de ambos os movimentos. Bolsonaristas guardam vagas semelhanças com janistas da década de 1950. O impulsivo Jânio não se atrelava a grandes partidos. Fez do combate ao governador Adhemar de Barros, fundador do Partido Social Progressista, conhecido como “homem da caixinha”, o alvo predileto. Bolsonaro encarna a figura do contrapetismo. Prega a luta contra a corrupção e a distribuição de armas ao povo. A mensagem moralista, entretanto, já se desgasta na medida em que, por falta de base parlamentar, aceita o fisiologismo do “centrão”. Os antibolsonaristas integram massa heterogênea, à qual faltam lideranças e projetos para vencer a crise.
Sem ser pessimista não consigo avistar alguma luz no fim do túnel. Nem sequer lhe conhecemos a extensão. Para enfrentar o desemprego o governo oferece passageiro auxílio emergencial. Mais da metade da População Econômica Ativa está desempregada, desocupada ou desalentada. Pesados encargos trabalhistas atemorizam empregadores quebrados e endividados, multiplicam as demissões e criam obstáculos à recontratação. Como pagarão o 13º salário em dezembro, se a economia não dá sinais de recuperação?
A legislação trabalhista protege declinante mercado formal. Quem, afinal, se preocupa com dezenas de milhões remetidos à informalidade e abandonaram a ideia de reencontrar colocação? A pergunta é formulada aos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
Para desempregados, subocupados, autônomos e desalentados, pouco importa se o candidato é de esquerda ou de direita. Querem acreditar em alguém que lhes traga esperanças de trabalho honrado, seguro e bem remunerado. Neste terreno fico com Ortega Y Gasset para quem “ser de esquerda é, como ser de direita, uma das infinitas maneiras que o homem pode escolher para ser imbecil”.
— Almir Pazzianotto é advogado. Foi ministro do Trabalho, presidente do Tribunal Superior do Trabalho