JÉSSICA ANTUNES, DA AGÊNCIA BRASÍLIA
Na palma da mão, o produtor rural Geraldo Magela Gontijo, de 57 anos, consegue controlar, catalogar e registrar o passo a passo de toda a produção de seu terreno no Núcleo Rural Pipiripau, em Planaltina. Para isso, ele usa o aplicativo DF Rural, criado pela Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Distrito Federal (Emater-DF). A rotina é essencial para o cumprimento da legislação nacional, que torna obrigatória a rastreabilidade da cadeia produtiva de vegetais frescos e de frutas produzidas no país.
A ferramenta está disponível em regime experimental para uso aos quase 25 mil produtores rurais cadastrados na empresa pública vinculada à Secretaria de Agricultura, Abastecimento e Desenvolvimento Rural do DF. Ela foi elaborada pela equipe da Emater em cerca de seis meses, sem custos extras para o governo. Apesar de ter outras funções, é a obrigatoriedade da rastreabilidade a principal motivação para uso.
A rastreabilidade é o conjunto de procedimentos que permite detectar a origem e acompanhar a movimentação de um produto ao longo da cadeia produtiva – desde o plantio até chegar ao consumidor. Isso deve ser feito por registros impressos em etiquetas, códigos alfanuméricos, código de barras, QR Code ou qualquer outro sistema de identificação da mercadoria – inclusive o feito à mão.
A obrigatoriedade veio com Instrução Normativa Conjunta publicada em fevereiro de 2018 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). O sistema começou a vigorar de forma gradual, de acordo com as diferentes cadeias produtivas.
Em agosto de 2019, produtos agrícolas como maçã, batata, alface e tomate passaram a ser sujeitas à fiscalização. É neste ano que finda o prazo para que todos os produtores de vegetais frescos e de frutas se adequem (veja tabela abaixo).
A rastreabilidade permite contar toda a história do produto, da concepção ao consumo. Assim, todos os elementos da cadeia produtiva são registrados
Alberto Gerardi, gerente do projeto DF Rural
Segundo o gerente do projeto DF Rural, Alberto Gerardi, esse registro dos elementos da cadeia produtiva tem três importâncias: cumprir a legislação, usar como forma de defesa, aproximar o produtor do cliente, e aperfeiçoar o negócio local com possibilidade de melhor gestão.
Ferramenta facilitadora
“Quando surgiu esse bicho papão da rastreabilidade, muitos produtores disseram que parariam de produzir porque achavam que não conseguiriam fazer isso. Com o aplicativo, ficou muito simples. A gente consegue fazer no fim do dia, na frente da televisão. É simples e fácil, não gasta mais que dez minutos”, conta o produtor Geraldo Magela Gontijo, que mantém produções de pimentão, tomate, maracujá e uva na estufa no terreno de dois hectares desde 1983.
O aplicativo DF Rural foi pensado assim: para ser fácil. Gerente do projeto, Alberto Gerardi aponta que pesquisas indicam que 90% dos produtores rurais da capital têm celular, mas não um computador. Dos que têm smartphones, 80% os usa como negócios. A ferramenta está disponível para download em dispositivos móveis com sistema operacional Android e não depende de internet para funcionar no dia a dia. Há previsão de implementação também nos IOS, o sistema operacional da Apple.
90%
dos produtores rurais têm smartphones
“Nós estamos oferecendo uma solução para que o produtor atenda a legislação”, define Gerardi. O aplicativo permite e incentiva o registro de toda a cadeia produtiva. Isso é necessário porque a legislação ordena que caixas, sacarias e outras embalagens de frutas e hortaliças devem ter informações padronizadas capazes de identificar o produtor ou responsável pelo produto.
É preciso informar endereço completo e nome do produtor, além de dados dos produtos, como variedade ou cultivo, quantidade, lote, data de produção, fornecedor e sua identificação (CPF, CNPJ ou Inscrição Estadual). Quando a colheita é adicionada ao sistema do aplicativo, a emissão de etiquetas é automática, e só precisa ser impressa pelo produtor.
Assim, é possível saber quando e onde um produto foi plantado, os insumos usados no cultivo – inclusive agrotóxicos –, quando foi colhido, de que forma foi embalado e transportado até chegar ao consumidor. Em caso de problemas com o produto, o sistema permite identificar em que ponto da cadeia de produção ocorreu a falha.
Conscientização evita sanções
O gerente do projeto DF Rural, Alberto Gerardi, ressalta que o papel da Emater é garantir a segurança alimentar do DF, atuando junto com o produtor para que ele cresça. “A empresa não é só repassadora de tecnologia, ela olha o produtor como um todo. O aplicativo foi pensado porque a questão da rastreabilidade é um ponto de risco para o produtor, que poderia deixar de produzir por não atender às normas.”
Para levar conscientização à comunidade rural, a empresa faz reuniões, trabalho de mídia, oficinas nos escritórios locais da Emater-DF e capacita técnicos de cada unidade da empresa. A intenção é que, com o aplicativo, os produtores adicionem o processo na rotina e tornem hábito o registro do passo-a-passo dos cultivos, evitando sanções.
Fiscalizações podem acontecer em todos os elos da cadeia produtiva. O não cumprimento da exigência pode render multas que variam entre R$ 2 mil e R$ 75 mil para as infrações leves, de R$ 75 mil a R$ 200 mil para as graves e de R$ 200 mil a R$ 1,5 milhão para as infrações gravíssimas. Os valores podem dobrar em caso de reincidência.