A CPI da Pandemia não sabe por onde começar, muito menos ainda aonde vai chegar, como lembrou a frase de Ulysses Guimarães o cronista Luiz Carlos Azedo, do Correio Braziliense. A sentença do patriarca da Constituição Cidadã será uma vez mais posta à prova, desafiada pelo novo formato dos parlamentos, dissolvidos pelas assembleias eletrônicas, perdendo, assim, seu conteúdo dramático, que eram os grandes momentos das comissões parlamentares de inquérito. Desafio para os “suiters” da TV Senado.
Como manter aquela tensão crescente dos grandes embates? Como substituir a gesticulação exuberante das perguntas do então senador Pedro Simon? A objetividade cortante do ex-deputado José Genoíno? Terá esse plenário “home office” condições de desestabilizar um depoente como nos velhos tempos das bancadas presenciais? E aquelas cenas recentes da tropa de choque da ex-presidente Dilma Rousseff e suas mulheres guerreiras na comissão do impeachment? Terão o senador Jorge Kajuru (ex-Cidadania?-GO) e seus seguidores o empuxe para levar esse jumbo ao ar? Esta é a pergunta que veio na abertura deste comentário. Os descrentes acreditam (sic) que vai ser um tiro n’água.
Então o que sobra? Aí está a questão: o alvo do projeto é o presidente Jair Bolsonaro. Como ele receberá o impacto desse ataque? Certamente se for mantido o objeto explícito da convocação, a CPI terá de comprovar a materialidade dos crimes de Sua Excelência. É preciso encontrar um atestado de óbito que comprove alguma coisa, como foi o cheque do motorista Eriberto França, na CPI do PC Farias, que depôs o presidente Fernando Collor, ou o depósito fake news da revista “Veja” que derrubou o presidente da Câmara, Ibsen Pinheiro, na CPI dos Anões do Orçamento. Tem se ser alguma coisa assim.
Se não tiver alguma coisa muito concreta na mão, Kajuru e seus seguidores, normalmente situados à direita no espectro político, estarão apenas abrindo a porta para a esquerda entrar com tudo e jogar um balde de água fria na campanha da reeleição do chefe do governo. Muito interessante esse desfecho. Nestes primeiros dias, enquanto a CPI não tomar forma, a dúvida nas oposições é se Bolsonaro ganha ou perde com tamanho disparate político, pois o que sobra disso aí serão eventuais perdas ou ganhos eleitorais. Como o ex-presidente Lula (a única força nítida de concorrência para 2022) está recolhido nessa questão de candidatura, o capitão estará sozinho do palco.
Resta saber como se comportará o presidente. Já vem dando mostras de que sua estratégia é dispersar os alvos, atirando contra os governadores que, como ele, têm (re)eleição pela frente em 2022. Para criar o que em linguagem militar se chama de ataque diversionista e assim confundir um pouco a opinião pública e apresentar um alvo nítido para suas brigadas digitais, Bolsonaro botou dois ministros do STF na roda, o tucano Alexandre de Moraes e o polêmico carioca Roberto Barroso, que está na mira da ultradireita como um prato feito devido às suas ligações perigosas, no passado, com o terrorista italiano Cesare Battisti.
Tudo isto daria um bom caldo a ser saboreado numa CPI convencional, dentro do figurino a que se presta este tipo de instrumento legislativo. Entretanto, aí está a própria pandemia a afastar os parlamentares das aglomerações. Este será um dos maiores desafios para a nova civilização virtual que se diz estar chegando. Senhores senadores, façam rapidamente um investimento em microfones e câmeras, pois com o atual nível de som e imagem, sem falar de enquadramento e figurino, das tais sessões virtuais, não conseguirão a audiência sonhada. Se assim for, ninguém ganha nada. Tampouco alguém perde. A CPI será, como nos jogos de Submarino da criançada, um tiro n’água.