Na próxima segunda-feira, 14, os americanos enviarão cerca de 150 milhões de cartões de Valentine’s Day – Dia dos Namorados – nos Estados Unidos.
Essa prática de Valentine’s Day, o segundo maior feriado para troca de cartões, depois do Natal. E o mais interessante: os professores são os que mais recebem cartões de Valentine’s Day, seguidos por crianças, mães e esposas.
Poucas vezes, em tempos recentes, um feriado terá pesado tão intensamente sobre o futuro das relações diplomáticas entre Washington (DC) e Brasília quando o importante apoio que, em termos gerais, pode agitar as próximas eleições presidenciais do Brasil.
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, terá que decidir, de fato, quem será o seu “Valentine” no Brasil. O líder democrata tem três candidatos: Jair Bolsonaro, Luiz Inácio Lula da Silva e Ciro Gomes.
Tipicamente, o presidente americano seguiria o tom do Departamento de Estado, mas o mundo vive um outro momento. A diplomacia americana não tem a mesma musculatura dos “anos dourados”. O secretário de Estado, Anthony Blinken, não é Henry Alfred Kissinger e muito menos James Baker. É outro cenário mundial.
A onda de fervor nacionalista vivida pela “Pátria de Flávia Schilling” nos últimos anos frequentemente esqueceu de lembrar, como sinalizam os barnabés mais lúcidos da diplomacia do Tio Sam, os problemas causados pela atual administração – problemas que, claramente, não são mais internos. Para os diplomatas americanos, é óbvio que o Brasil não necessita que seus erros lhe sejam apontados de fora, e nem que lhe determinem o que pode e o que não pode fazer – leia-se votar.
Mas é certo, também, que toda essa discussão sequer seria iniciada se o Brasil vivesse, de fato, dentro de instituições plenamente democráticas.
Em todo o elenco de julgamentos que fazem habitualmente ao atual presidente brasileiro, poucos terão representado um ônus tão incômodo ao longo dos últimos anos, quanto aos que apontam para os atos de desrespeito aos direitos humanos. Tais críticas são particularmente devastadoras para a dignidade de Jair Bolsonaro quando envolvem o tratamento dados a cidadãos que trafegam na oposição do seu governo. “Pela primeira vez na história, um presidente brasileiro comunga os mesmos ideais de liberdade e democracia dos Estados Unidos”, destaca um defensor de Bolsonaro na capital americana.
Lula enfrenta a “maldição do terceiro mandato”
Em favor do candidato petista, onde o argumento do desenvolvimento é uma bandeira, o seu governo foi de redução da miséria e de redistribuição de renda, graças também a fatores políticos capazes de manter agradável a temperatura e esperançosos os ânimos. Assim, a sóbria e tranquila administração de Lula, um acontecimento que no passado em frequentíssimas ocasiões, produziu repercussões internacionais, poderá ser certamente decisiva.
A história oferece exemplos impressionantes do que alguns cientistas chamam de “maldição do terceiro mandato”. Observadores políticos ficaram chocados com a autodestruição do ex-governador de Nova York, Andrew Cuomo, durante o seu terceiro mandato.
A cidade de Nova York registra diversos casos. O terceiro mandato de Ed Koch mostrou que as forças políticas podem mudar num lance de mágica. Koch ganhou o terceiro mandato como prefeito de Nova York com 78% dos votos. Uma cascata de problemas logo tomou conta de seu governo, incluindo um grave escândalo de corrupção no Departamento de Violações de Estacionamento.
O escândalo resultou em condenações criminais para os aliados de Koch, Stanley Friedman e Meade Esposito, presidentes democratas do Bronx e do Brooklyn, respectivamente. O presidente do Queens, Donald Manes, foi implicado no escândalo e cometeu suicídio. O terceiro mandato de Koch também foi marcado por tensões raciais, a epidemia de crack, a crise da AIDS, a falta de moradia e a explosão dos índices da criminalidade na Big Apple.
Nelson Rockefeller, às vezes referido por seu apelido, Rocky – o mais importante governador de Nova York da era moderna – ganhou um quarto mandato em 1970 por 730 mil votos. O quarto mandato de Rockefeller prejudicou consideravelmente seu legado. Foi notável pelo motim na prisão de Attica, pela aprovação de leis draconianas sobre drogas e pela deterioração do quadro fiscal do estado. Quando as negociações com os presos chegaram a um impasse, Rockefeller se recusou a ir para Attica e ordenou que a polícia estadual retomasse a prisão.
O banho de sangue que se seguiu terminou com 29 presos e 10 reféns mortos, quase todos nas mãos da polícia estadual. Durante o último ano de Rockefeller no cargo, ele impôs leis duras sobre drogas que enviaram muitos indivíduos para a prisão por delitos menores e tiveram um impacto especialmente devastador nas comunidades e famílias minoritárias.
Michael Bloomberg também foi vítima da “maldição do terceiro mandato”. Seus dois mandatos de forte administração fiscal, sucesso na segurança pública e inovações em saúde pública e ambientais fizeram dele o prefeito mais popular da história da Big Apple. Como um atleta que se aposenta após uma temporada de campeonato, Bloomberg teve a oportunidade de sair do palco da cidade em alta. É difícil entender o que motivou o prefeito Bloomberg a querer outro mandato; talvez ele realmente sentisse que era indispensável diante de uma recessão econômica paralisante; ou, com a mesma probabilidade, ele não sabia o que fazer a seguir e era difícil renunciar aos holofotes da prefeitura de Nova York.
A estrela de Ciro ainda brilha em Washington
Ciro Gomes tem a experiência certa para ser presidente. O currículo do pedetista é, sem dúvida, um dos mais impressionantes de qualquer político em qualquer partido. O momento – o Covid-19 continuando a assolar o país, os problemas da cadeia de suprimentos, a expansão da fome e da miséria– apontam para a necessidade de uma mão firme no Palácio do Planalto.
As personalidades dos candidatos importam em campanhas fechadas. Isso vale em dobro para uma corrida presidencial que tende a ser mais dependente da personalidade e simpatia do que de qualquer tipo de prescrição política.
Ciro ainda tem tempo para melhorar. Mas ele já foi candidato em três ciclos de eleições presidenciais e, pelo menos para muitos observadores neutros da esquerda, ele ainda não parece “entender” como ser candidato. Ele pode encontrá-lo? E, se não, qual será a única opção viável de esquerda para o Brasil?