A vingança da Província

O autor, pelotense, fala de seu rincão e da possibilidade de um filho da terra chegar ao topo da política brasiliana

Voltei de Pelotas (RS) há pouco. Há uns 20 dias mais ou menos. É uma cidade que está em decadência econômica há um século. Não é a mais profunda mas é uma das mais longas e persistentes da história do Brasil. A cidade tem marcos históricos culturais e econômicos. Foi um centro logístico e financeiro dos farroupilhas que lutaram durante 10 anos contra todos, mas principalmente contra os monarquistas de Porto Alegre e Rio Grande, o único porto do Estado.

O jornalista e historiador José Antônio Severo, de Caçapava do Sul, segunda capital dos Farrapos, que fez a desfeita de nos deixar outro dia, dizia que a guerra havia sido um conflito entre as elites de Pelotas e Porto Alegre. O separatismo geral foi apenas uma distorção da ótica dos que preferem transubstanciar a história em folclore, ou vice-versa.

O jornalista e escritor José Antônio Severo foi colaborador d’Os Divergentes

O charque deu a cidade uma pioneira industrialização e o porto rio-grandino, sua globalização. No final do século 19, São Paulo, Campinas, Porto Alegre e Pelotas tinham cerca de 50 mil habitantes. Campinas e Pelotas aproveitaram a riqueza para sofisticar suas elites. A Educação e a Cultura subiram de patamar. A rapaziada local era vista por seus vizinhos como dândis.

Daí a simplificação da imagem que une as duas pontas da ficcional e divertida free way “Transviadônica”. Neste século de marasmo, a região teve breves despertares. E longuíssimos adormeceres. Rio Grande, na época do medo e delírio do Pré-Sal, arrastou Pelotas para um crescimento inesperado. Passada a euforia, a cidade ganhou condomínios sofisticados e shopping centers.

Na vizinha “Noiva do Mar”, ficou para trás a triste sucata enferrujada do que poderia ter sido a grande redenção do extremo sul. O nosso cinturão da ferrugem. Eu disse, há pouco, no mais longevo programa de debates do rádio brasileiro, o “Pelotas 13 horas”, do jornalista Clayton Rocha, há 43 anos no ar, que a região tinha que enxergar na candidatura à presidência da República do jovem Eduardo Leite algum subproduto positivo para a cidade, pois foi ali, no 13 horas e na Câmara Municipal, aos 19 anos que ele começou a sua carreira profissional.

O governador gaúcho Eduardo Leite no Palácio Piratini, em Porto Alegre

Pragmatismo irresponsável? Muita gente torceu o nariz. Em todos os segmentos e subfrações. Leite neste momento está disputando prévias com seus correligionários em São Paulo. Não é pouca ousadia política. Enfrentar tucanos, petistas e a Fiesp em São Paulo é missão dura para eles mesmos. Tenho certa experiência no couro…

Muitos preferem continuar no debate em torno de programas periféricos ou de promessas não cumpridas. A pauta das questiúnculas cotidianas da província nos puxam os pés todas as noites.

O general Garrastazu Médici, então presidente do Brasil, na rampa do Palácio do Planalto – Foto: Orlando Brito

Em 1970, quando comecei no jornalismo, fui à inauguração do superporto de Rio Grande, feita pelo ditador Garrastazu Médici, nascido em Bagé. A nossa região teve esperança com Médici e com Dilma Rousseff.

Dilma foi a responsável pela segunda “turbinada” no Porto. Seja de onde vier, que venham novos alentos. É muito tempo jogando na segunda divisão. A província é indiferente ao relevante. Mas preocupadíssima com o irrelevante. É o vale da morte das ousadias e pioneirismos.

“Abajo, acima, adentro”. De copo cheio na mão, dizia o ator Antônio Pedro, no filme de Hugo Carvana, Bar Esperança, o último que fecha. Está na hora de brindarmos a fase seguinte da esperança.

Avante.

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