Decisões de Donald Trump no campo do comércio mundial – seja por meio do aumento de tarifas às exportações para o mercado interno americano, seja com sanções – estão impondo uma nova configuração as relações internacionais. Desde que assumiu, o mandatário americano tem cumprido à risca o que prometeu nessa área, notadamente com a China – de longe o caso mais evidente – e todos os países que vendem produtos manufaturados aos Estados Unidos.
Com o México ele ameaçou elevar em 25% a tarifa de todos os produtos destinados ao mercado americano se aquele país não concordasse em conter o fluxo de emigrantes centro-americanos em suas fronteiras. O governo mexicano cedeu, afinal 85% de suas exportações vão para os Estados Unidos.
Trump e os que o apoiam internamente – que não são poucos – acreditam que esse fluxo migratório irá tirar emprego dos americanos, além de causar aumento da criminalidade no País.
O presidente americano já havia dado uma pancada na economia mexicana ao renegociar o acordo de livre comércio que tinha com este país e o Canadá. O Nafta, que movimentava US$ 1,2 trilhão entre os três países, agora têm uma nova designação: Acordo Estados Unidos-México-Canadá. Quem saiu ganhando foram os EUA, impondo tarifas mais altas nas exportações dos vizinhos para seu mercado.
Primeiro, os EUA. Depois, o mundo
O setor da economia mais beneficiado foi a indústria automobilística e toda a cadeia produtiva do setor no “Cinturão da Ferrugem”, uma designação autoexplicativa para uma região que fica no Nordeste do país, outrora o berço industrial do país. Fazer o quê? Neste caso vale o batido clichê – manda quem pode e obedece quem tem juízo.
Donald Trump age dessa forma porque a economia americana ainda é a maior do planeta e naturalmente compra produtos industrializados de todo mundo. O alto poder aquisitivo da população americana, apesar das imensas desigualdades, faz com que o consumo interno seja o fator mais relevante na composição do PIB do país.
Essa relação deixa a indústria e a agricultura bem atrás na participação da riqueza nacional, embora os dois setores ainda sejam mais relevantes do que boa parte dos termos de trocas com outros países.
Desde que tomou posse, um dos focos da política comercial e industrial de Donald Trump é a recuperação da indústria manufatureira do País e a taxação de produtos acabados de outros países, com destaque para a siderurgia, a metalurgia e empresas automobilísticas e de bens duráveis. Esse setor sofre forte concorrência do que é produzido no México e no Canadá.
China, o primeiro alvo
O primeiro ato de Trump foi a ordem executiva que rompeu um grande acordo comercial assinado por Barack Obama – o Acordo Transpacífico de Cooperação Econômica (TPP, na sigla em inglês) -, que reunia 40% da economia mundial, um mercado de 800 milhões de consumidores. Japão, Austrália, Canadá, México, Peru, Chile, Malásia, Vietnã, Nova Zelândia, Cingapura e Brunei continuam no pacto.
– O que acabamos de fazer é uma grande coisa para os trabalhadores americanos, disse Trump.
Trump tem a compreensão – não de todo errada – que os produtos chineses tiram a competitividade da indústria de alta tecnologia do país. A proibição da Huawei, gigante de tecnologia da China, atuar em território americano é exemplar. Mesmo sob suspeita de espionagem para o governo chinês, a intenção é barrar a tecnologia de 5G da chinesa num mercado altamente competitivo nos próximos anos e que redefinirá o uso da internet.
No campo puramente comercial, contudo, a iniciativa de Trump ainda não mostrou completamente seu efeito. O impacto das tarifas – equivalentes a impostos pagos pelos próprios americanos ao comprarem produtos mais caros por falta de concorrência -, segundo economistas, ainda não foi sentido pelos consumidores.
O governo Trump espera que isso aconteça a partir de setembro, quando as empresas fazem encomendas para as importações do ano seguinte.
Os EUA espirraram…
O governo americano também tem um poderoso instrumento de política comercial, que é sua taxa de juros. Qualquer decisão do Fed – o Banco Central dos Estados Unidos – afeta a economia de todo o planeta.
Se os preços aumentarem como consequência da guerra comercial de Trump, o presidente do banco, Jerome Powell, subirá a taxa de juros, o que deixa Trump de cabelo em pé. Literalmente. Com a campanha eleitoral se aproximando essa é uma possibilidade que Donald Trump nem quer ouvir falar.
Trump tem uma janela de oportunidade para comprovar se suas políticas protecionistas vão funcionar. Até o final deste ano a economia dos Estados Unidos deverá apresentar algum efeito dessas medidas. Ele espera ainda que um novo acordo comercial com a China – ainda em negociação –já esteja mostrando algum resultado na geração de empregos internamente no próximo ano.
* Luís Eduardo Akerman é jornalista e analista de política exterior. Ex-editor de Internacional do Jornal de Brasília.