Quem tem menos de 40 anos não sabe o que é viver em um país com hiperinflação e moeda fraca. Pode até já ter ouvido relatos dos pais de como as maquininhas de remarcação de preços trabalhavam dia e noite em velocidade supersônica, mas é uma realidade distante para essa parcela da população. É como tentar explicar a eles como viver em um mundo sem computador e internet. Simplesmente inconcebível.
Naquela época os salários registrados nas carteiras eram recheados de dígitos. Eu, uma “foca” na redação, ganhava quase 100 mil. Parece muito, mas na verdade era pouco mais que o mínimo, o piso dos jornalistas. Nem lembro se era cruzeiro, cruzado ou cruzado novo. Não importa. O fato é que apesar de tantos dígitos, no final do mês mal dava para pagar o lanche na barraca que ficava ao lado do jornal. Essa semana, em visita a Argentina, me deparei com a realidade dos nossos hermanos e me senti dentro de um filme antigo, uma verdadeira sensação de déjà vu. A alta da inflação e a desvalorização da moeda levaram os preços ao infinito e o dólar ao além. Enquanto nós aqui no Brasil reclamamos da moeda americana ter chegado ao patamar de R$ 4,00, no vizinho, o valor do dólar já ultrapassa os 40 pesos. O real está cotado a 9,18 pesos.
Nada por lá custa menos de 100 pesos. Com o troco do hotel, cerca de 140 pesos, tentei comprar algumas coisas no mercadinho mais próximo. Tudo que consegui levar foram três garrafinhas de 300 ml de água mineral e um pote pequeno do famoso “Dulce de Leche” argentino. Isso porque era a marca mais barata. Não sobrou nenhuma moedinha. Essa sensação de déjà vu me fez refletir sobre o que estamos vivendo aqui no Brasil. Claro que nossa realidade é diferente. Somos maiores e nossa economia é mais forte, mas precisamos ficar atentos. A Argentina é um dos nossos principais parceiros comerciais.
É também, assim como o Brasil, um dos mais importantes países da América Latina. Não sou especialista em economia, mas pelo que li e apurei por lá, a crise argentina é resultado de uma sequencia de erros cometidos nos governos Kirchner e Macri. A falta de controle nos gastos públicos e o descuido com a inflação fizeram a Argentina voltar aos anos 90. Um retrocesso de décadas. No Brasil, se não cuidarmos, infelizmente, podemos ter um efeito Orlof. Não digo que chegaremos a situação da Venezuela, mas é sempre bom lembrar que a Argentina fica logo ali. Preocupa-me muito o fato das propostas dos candidatos à presidência da República para a economia estarem sendo negligenciadas por grande parte dos eleitores.
Lamentavelmente, muitos estão decidindo o voto pelo critério de amor ou ódio. Tenho visto muito pouca coisa ser discutida seriamente sobre o futuro da nossa economia. Ao que parece, as eleições de 2018 no Brasil não devem seguir a máxima do marqueteiro do ex-presidente americano Bill Clinton, James Carville, que em 1991 pronunciou a celebre frase, “É a economia, estúpido”, referindo-se ao fator que iria decidir as eleições americanas naquele ano.
A máxima no Brasil este ano será: “é a paixão, estúpido”.