Neste País de incultos e desmemoriados poucos se recordam do Dr. Tancredo Neves, aquele que foi presidente da República sem nunca ter sido. A ele devemos creditar a passagem,
sofrida e cheia de obstáculos, do regime militar para a democracia.
Completaram-se no dia de ontem, 21 de abril, 35 anos de sua morte. Estive ao seu lado no Santuário Dom Bosco, em Brasília, no anoitecer de 14 de março, por ocasião da missa de
ação de graças pela posse programada para o dia seguinte, quando receberia a faixa presidencial das mãos do presidente João Figueiredo.
Terminada a cerimônia religiosa o Dr. Tancredo Neves retirou-se para o Palácio dos Jaburus, enquanto eu me dirigia para a residência destinada ao Ministério do Trabalho.
Por volta de 21 horas recebi telefonema do governador Franco Montoro, de quem fora Secretário do Trabalho. Comunicava-me a internação do Dr. Tancredo no Hospital de Base.
Dispenso-me de comentar o que se passou desde então. Relembro, porém, que no dia seguinte, em ambiente de profunda apreensão, tomou posse o vice-presidente José Sarney, de quem fui Ministro do Trabalho até setembro de 1988.
O Dr. Tancredo deu a vida pela redemocratização.
Vítima de grave enfermidade enfrentou dura campanha no Congresso Nacional para derrotar no colégio eleitoral o candidato da Arena, Paulo Maluf. Ausente o Dr. Tancredo, e com o País dividido e em crise, coube ao presidente José Sarney garantir a
transição até que se promulgasse a Constituição de 1988.
Ao ver o presidente Jair Bolsonaro prestigiar manifestação golpista, organizada para propor o regresso à ditadura, a Nação unida deve invocar os espíritos de Tancredo Neves, Ulysses Guimarães, Aureliano Chaves, Franco Montoro, Afonso Camargo, Renato Archer, José Fragelli, e de militares como o general Leônidas Pires Gonçalves, brigadeiro Otávio Júlio Moreira Lima, almirante Henrique Sabóia, e cobrar a identificação e punição dos inimigos da democracia.
A era do militarismo acabou. Sobrevive pela força em poucos países. Superada a pandemia o povo voltará ao trabalho, para reconstruir a economia, dentro, porém, de saudável clima de liberdade.
— Almir Pazziannotto Pinto é advogado. Foi Ministro do Trabalho e presidente do Tribunal Superior do Trabalho