Povo no poder, frase maldita que derruba presidentes no Brasil

Pedir o apoio das ruas para se manter no poder não tem um bom retrospecto no Brasil. Na crônica de Pinheiro do Vale, exemplos desde os tempos dos marechais presidentes

O presidente Jair Bolsonaro soltou, no domingo, 19, a frase maldita que esteve na boca de chefes do governo que foram depostos, legal ou ilegalmente, na história republicana do Brasil. “Povo no Poder” é a expressão que esteve na boca de todos, desde Deodoro da Fonseca até Dilma Rousseff.

Falando num palanque improvisado na carroceria de uma pick-up, em frente ao Quartel General do Exército (QG), em Brasília, o presidente (e comandante em chefe das Forças Armadas, pelo menos formalmente), Bolsonaro disse, em alta voz, engasgando-se e tossindo: “Nós não queremos negociar nada. Queremos é ação pelo Brasil”, disse. Foi aplaudido por centenas de manifestantes. “Chega da velha política! (…) Acabou a época da patifaria. Agora é o povo no poder. Vocês têm a obrigação de lutar pelo País de vocês”.

O significado da mensagem é que as demais instituições, Legislativo e Judiciário, estão atrapalhando o Governo. Ou melhor dizendo: o presidente não consegue executar o programa a que se comprometeu na campanha eleitoral, e que o levou ao poder. Com isto, seus adversários seriam traidores da causa, merecendo o repúdio da população.

Desde Deodoro

Os marechais presidentes Deodoro e Floriano

Outros presidentes depostos tiveram o mesmo confronto com as demais instituições. Todos caíram. O fundador da República, marechal Deodoro da Fonseca, renunciou confiando em sua popularidade, mas o vice-presidente Floriano Peixoto, também marechal do Exército, alegando convulsão interna, decretou estado de sítio para não realizar eleições suplementares e ficou até o final do mandato. O povo não derrubou o mandatário.

25 de agosto de 1961, a renúncia de Jânio na capa do periódico Folha de S. Paulo

Já na República de 1945, o presidente Jânio Quadros apelou diretamente ao povo, criou um fato chocante com a renúncia, mas não conseguiu voltar ao poder. Seu sucessor, o vice-presidente Jango Goulart, também apelou diretamente às ruas para implantar suas reformas de base, mas foi derrubado pelo próprio Congresso, que, majoritariamente, apoiou um movimento militar e declarou vago o cargo de presidente da República, elegendo um general, Castello Branco, para completar mandato. Deu no que deu: um regime autoritário por 21 anos.

Já no regime democrático da Nova República, o presidente Fernando Collor também chamou o povo às ruas vestindo verde e amarelo. A esquerda reagiu com vestes pretas. Meses depois o presidente da República foi deposto por um impeachment no Congresso, acusado de crime de responsabilidade, absolvido pelo STF algum tempo depois, que não viu provas nem culpa. Não deu certo.

A presidente deposta Dilma Rousseff – Foto: Orlando Brito

Também a presidente Dilma Rousseff confiou no poder das ruas e na capacidade de mobilização de seu partido, o PT, para reagir às manifestações de protesto de 2013. Não negociou com o Congresso. Perdeu. Meses depois teve seu mandato cassado pelo Parlamento.

Getúlio foi a exceção

Esses são os exemplos. Um caso raro foi do então presidente constitucional Getúlio Vargas, em 1937. Ele suspendeu as eleições, fechou o Congresso, extinguiu os partidos e sufocou os movimentos políticos. O golpe de estado foi dado pelos generais, chefiados pelo ministro da guerra, Eurico Gaspar Dutra. Na hora do golpe, Vargas estava num jantar. Não interrompeu a festa, quando chegou a notícia de que os tanques da Vila Militar estavam no centro da cidade. Ou seja: estava dando a entender que os militares lhe ofereciam a continuidade no poder. Não era dele a autoria. Caso único.

Como dizia o então governador do Rio Grande do Sul, Borges de Medeiros, “a popularidade é uma deusa cadela”.

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