No caso Marielle Franco, foi preciso o professor da FGV e UnB, Nelson Barbosa, descer da sua cátedra e botar o dedo na ferida para a grande interrogação vir à tona: por que a vereadora do Psol foi assassinada? No dia seguinte à coluna do ex-ministro da Fazenda e do Planejamento da presidente Dilma Rousseff, publicada na Folha de São Paulo de sexta-feira, 13, já parece que a mídia acordou e nas páginas do sábado pontilhavam referências aos motivos inexplicados do crime.
Entrava uma pergunta essencial, que até esse dia não era sequer mencionada nas análises e narrativas sobre o assassinato, que circularam pelo mundo inteiro. Com a judicialização do caso, para levar os acusados, Ronnie Lessa e Élcio Queiroz, ao tribunal do júri, foi necessário introduzir esse quesito: por que matar à moça? O motivo apresentado nos autos é de crime de ódio.
Certamente nos tempos dos grandes repórteres policiais do passado, como os falecidos Pena Branca (Otávio Ribeiro), Vanderlei Soares ou o ainda atuante Percival de Souza, nos seus tempos de Jornal da Tarde, esta questão já teria sido levantada nas páginas policiais.
Duas perguntas derivam dessa dúvida, que é básica: a encomenda da morte de Marielle seria uma queima de arquivo? E, neste caso, o que de tão grave seria de seu conhecimento ou teria a participação da vereadora para justificar um crime caro e sofisticado?
Quem mandou e quanto pagou pelo “contrato”, financiando uma ação de alto profissionalismo, com armas sofisticadas, com mira de calor capaz de localizar o alvo no escuro por detrás da lataria do carro e dos vidros fumê, além de um estabilizador para permitir o disparo certeiro com os dois automóveis, da vítima e do atirador, em movimento? (O pistoleiro acertou todos os tiros).
Esta pergunta final pode embaralhar o senso comum, que já dá os dois milicianos cariocas como culpados e, certamente, condenados. Caberá aos repórteres fazer as perguntas de praxe que mesmo o mais novato foca aprende quando chega a uma redação de jornal: quem, o que, quando e por quê?
O ex-ministro, que só tem diploma de economista e da New School for Social Research, com sua objetividade de acadêmico, deixou os jornalistas profissionais do Brasil que cobriram o caso em maus lençóis. Botou a dúvida na mesa.
Como explicar tamanho aparato bélico, o uso de sicários de padrão internacional, de armas desconhecidas (a não ser pelas unidades especiais das Forças Armadas) para matar uma vereadora de primeiro mandato, de um pequeno partido de oposição, sem poder e sem articulações para interferir na administração ou para criar embaraços reais aos grandes chefões do crime? É a pergunta que o promotor, encarregado das acusações, terá de responder e convencer os jurados de que os dois milicianos, homens frios e calculistas, abriram fogo porque se irritavam com as pregações esquerdistas da vítima. Esta será a tese do Ministério Público do Rio.
A pergunta do professor Barbosa abre o capítulo do mistério. Quem foi o chacal? O que Marielle sabia ou fazia para provocar tamanho abalo no submundo?
Estas respostas podem mudar completamente o rumo das hipóteses sobre crime de ódio racial, de gênero ou ideológico que compõem as provas que a polícia carioca vai oferecer ao conselho de sentença. Muita água voltará a correr debaixo dessa ponte.