A previdência vai derrubar os muros. Os deputados dos partidos da oposição dos estados governados pela esquerda estão sendo tratorados para dentro da vala comum pela reforma da previdência.
Não há como escapar. Vai embolar direita e esquerda no mesmo buraco. Governadores e, mais abaixo, os prefeitos estão empurrando o acelerador da patrola.
Servidores ativos, inativos, viúvas e órfãos batem às portas de prefeituras e palácios perguntando pelos tutus deles. Como sair dessa enrascada?
A carta na manga
Governadores, a carta na manga de Jair Bolsonaro. Se a previdência é a porta do inferno para o presidente da República, os governadores dos estados já estão queimando lá dentro.
A situação desesperadora dos estados vai obrigar as bancadas a se unirem na reforma como tábua de salvação para os governos regionais. Juntando a União com os estados, a perspectiva é morrerem todos abraçados.
Embora parlamentares da oposição apareçam vociferando contra Paulo Guedes diante das câmeras das tevês, no escurinho do cinema estão se dobrando à realidade. Mas ainda não há consenso.
Os governadores dos partidos que não integram a base de sustentação do governo federal pressionam suas bancadas. São oito estados, talvez onze, dependendo do que decidir o PSDB. Quatro do PT, três do PSB e um do PDT.
Já os parlamentares se torcem e se coçam, tentando escapar. Mas não há saída, pois os companheiros dos executivos estaduais e municipais estão marcando em cima. É a realidade.
Candidatos na sinuca
Por exemplo: no PT, há fortes resistências onde o partido precisa se firmar como oposição para reiniciar sua caminhada ao poder, para cumprir sua missão de alternância com o PSL. Entretanto, malhar a previdência do governo, que é o melhor alvo, complica a vida dos governadores e prefeitos, estes com uma eleição logo ali na frente.
Candidatos competitivos estão numa sinuca. Dois exemplos de aspirantes a governadores que têm pela frente governadores do PSDB com projetos de reeleição são os deputados Paulo Pimenta, no Rio Grande do Sul, e Carlos Zarattini, em São Paulo. Ambos do PT, estão de mãos amarradas por companheiros nordestinos, com problemas eleitorais bem diversos dos seus.
Nos últimos dias, discretamente, as lideranças parlamentares estão ouvindo de seus governadores o pedido de socorro. Estes nem bem botaram os pés na calçada dos palácios e já encontraram, de pires na mão, centenas de prefeitos. Então, abrindo o cofre vazio das joias da coroa veem um brinquinho ao fundo; examinado, é uma bijuteria.
Choque de realidade
O rombo da previdência é o primeiro choque de realidade pós-eleitoral. Quando se olha para a folha de pagamento acaba a ilusão dos discursos.
Acaba direita e esquerda, companheiros e adversários, o que se vê à frente são as mãos dos pedintes exigindo seus direitos. Esta será a arma do governo federal para dobrar todas as bancadas. Estão todos numa frota de barcos fazendo água por todo o madeirame dos costados.
Mesmo os estados mais poderosos não conseguem mais pagar suas folhas de servidores ativos. Menos ainda os inativos.
Os vitoriosos de outubro estão à procura, o quanto antes, de alguma coisa que lhes dê um alívio ao drama em que se meteram quando entraram cheios de pompa pela porta da frente de seus palácios. Os governadores estão enlouquecidos com o blefe das delícias do poder.
O caso não é de ter ou não ter a verba federal como vulgarmente se pensa, mas de criar uma situação estrutural a mais próxima possível de um mínimo de sustentabilidade imediata. Não é o toma-lá-dá-cá do estereótipo, mas sim de usar o poder de pressão e de criar situações que possam repetir-se nos estados e, até mesmo, nos municípios, para obter um equilíbrio mínimo das contas públicas.
A vida como ela é
Considerando que para os governadores a vitória de uma barganha seja algo que sirva para todos, a oposição está procurando espicaçar o presidente levando-o a um constrangimento com os militares. Defende só aprovar o pacote dos funcionários civis se incluídos no mesmo saco os servidores fardados. É tiro na água.
Como disse o ex-governador do Espírito Santo, Paulo Hartung: “A reforma da Previdência não é uma escolha, e sim uma imposição dos fatos, e, portanto, não pode ser objeto de barganha – pela simples razão de que uma eventual rejeição do projeto seria catastrófica, não apenas para o governo federal, mas para todos os entes federativos e para o conjunto dos cidadãos”. Como dizia o dramaturgo Nelson Rodrigues: “A vida é como ela é”.