Mesmo cauteloso com os atuais níveis de atividade da economia e comportamento da inflação, o Banco Central (BC) deu ao presidente da República, Jair Bolsonaro, o que nenhum dos mandatários anteriores teve: a bandeira das menores taxas básicas de juros do País. Na última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), o BC reduziu para 4,5% a Taxa Selic usada nas operações interbancárias.
“Com esses percentuais economizaremos, a título de juros, aproximadamente R$ 110 bilhões em 2020”, disse Bolsonaro em sua conta no Twitter. O orçamento da União, que foi enviado ao Congresso Nacional antes desta decisão do BC, prevê um desembolso de R$ 409,6 bilhões com juros no ano que vem. A dúvida que fica é se a equipe do ministro Paulo Guedes, da Economia, já tinha feito as projeções de gastos com rolagem da dívida baseado nesta nova taxa de juros.
O importante neste caso é que, se o dado do presidente Bolsonaro estiver correto, ajuda o Tesouro Nacional a reduzir o déficit nominal das contas públicas. A economia que o Tesouro estará fazendo não deve ser entendida apenas como uma tungada nos banqueiros.
Os bancos, pela natureza dos negócios, são detentores de grande quantidade de capital, mas a maioria dos papéis do Tesouro Nacional são adquiridos por fundos de pensão, investidores institucionais e poupança dos velhinhos e velhinhas.
Investimento negativo
Aqui vale lembrar que o Banco Central está dando passos para taxas de juros negativas para o poupador, não o tomador de crédito. É que, com a atual Selic de 4,5%, quem for aplicar recursos em um banco vai receber, na melhor das hipóteses, deduzida os impostos, 80% deste valor.
Assim, o poupador terá uma rentabilidade nominal de 3,6% ao ano. Quando descontada a inflação – até aqui de 3,24% pelo IPCA – o ganho real ficaria em apenas 0,36% ao ano.
Com uma nova rodada de queda de taxas, o Brasil passa a ter juros reais negativos para os poupadores. Já para o tomador de crédito privado, em função dos spreads bancários, dificilmente será negativo no Brasil.
Em nota divulgada pelo Copom fica claro que, embora a queda dos juros possa ser uma bandeira de Jair Bolsonaro, seus feitos de estímulo à retomada do crescimento da economia é de baixo impacto. “O atual estágio do ciclo econômico recomenda cautela na condução da política monetária”, diz, em nota, o Copom. O que dá para entender é que, sem esta cautela, o corte da taxa seria maior do que os 0,5% , aproximando a política de juros reais negativos da praticada por muitos países europeus.
A inflação está viva
O Copom enfatiza que seus próximos passos, de redução de juros, continuarão dependendo da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação.
Aqui, a autoridade monetária dá uma demonstração de insegurança em relação à eficácia da sua política monetária de estímulo ao crescimento da economia. Os riscos na área fiscal continuam presentes, mesmo com a reforma da previdência. A preocupação com a inflação é bem real, como podemos sentir com os aumentos do preço da carne e o impacto da desvalorização do real sobre os produtos importados.
O BC diz que dados de atividade econômica a partir do segundo trimestre indicam que o processo de recuperação da economia brasileira ganhou tração em relação ao observado até o primeiro trimestre de 2019. “O cenário do Copom supõe que essa recuperação seguirá em ritmo gradual”. Como o ritmo pode ser gradual, fraco, o BC poderá reduzir ainda mais as taxas de juros.
Economia: andando de lado
Se, de fato, a economia ganhou tração para crescer, é muito bom. Mas é preciso saber se esta tração se mantém mesmo após a liberação dos recursos do FGTS. A realidade é que a diferença entre as taxas básicas de juros do BC e o custo efetivo do tomador de crédito final é muito grande em função dos spreads bancários.
Alguns setores da economia, como financiamento imobiliário, são os que mais percebem o efeito da queda dos juros e algumas operações de crédito de longo prazo. Em tese, juros neste patamar deveriam estar contribuindo para bombar a economia, mas não é isso o que vemos.
A economia continua andando de lado, sem conseguir ampliar o emprego, a renda e o consumo. É provável que estes espasmos de crescimento de 1% PIB este ano e 2,3% do PIB em 2020, fiquem nisso. Com este patamar de crescimento continuaremos com milhares de pessoas fora do mercado de trabalho e o Governo sem arrecadação de impostos suficiente para reequilibrar suas contas públicas e atender as demandas de gastos na área social e em investimentos.