O competente advogado Rodrigo Pacheco, presidente do Senado Federal, entende até dos pontos e dos pingos nas leis. Não há dúvida sobre sua competência nesse terreno. Na política, apresentando-se como herdeiro de bem sucedidas tradições mineiras, ele joga hoje com dois baralhos. Em um deles se apresenta como presidenciável, ponderado e equilibrado, carta boa também para compor como vice uma chapa competitiva. No outro, mergulha na barafunda do dá aqui leva ali no subterrâneo das negociatas no Congresso Nacional.
O problema para quem se expõe aos holofotes de uma campanha presidencial é se equilibrar entre esses dois scripts. Letícia Borges que, entre outros atributos, conhece de cor e salteado a política mineira, diagnosticou aqui que Rodrigo Pacheco queimou sua largada na corrida presidencial ao se tornar protagonista na negociação com o STF para liberar o escandaloso Orçamento Secreto.
Rodrigo Pacheco tentou sair pela tangente do mandamento constitucional que exige que a destinação de dinheiro público tenha no mínimo publicidade e impessoalidade. Por se chocar frontalmente com a Constituição, o tal Orçamento Secreto, deveria ser sido barrado no Congresso. Não foi. Virou mais poderosa arma de Arthur Lira para bancar seu reinado na Câmara.
No Senado, tornou Davi Alcolumbre tão poderoso que, mesmo com a reeleição barrada pelo STF, emplacou Rodrigo Pacheco com o apoio do Palácio do Planalto ao PT. Quem no Senado herdou a gestão do Orçamento Secreto foi justamente Rodrigo Pacheco. Talvez seja por isso que se atropele em papéis conflitantes entre a imagem que projeta e seu verdadeiro espelho.
Não foi apenas seu bom-mocismo que entrou na berlinda. A imagem da ministra Rosa Weber também foi tisnada, depois de ouvir os argumentos de Pacheco, e reabrir as portas para bilionárias despesas secretas nesse final de ano. O que se diz nos bastidores dessa conversa é que ela acreditou na promessa de fim da caixa preta nas emendas de relator, o que revelaria o passado e evitaria os mesmos procedimentos no futuro.
Virou piada no parlamento. A Comissão Mista de Orçamento do Congresso, além de ignorar a decisão do Supremo Tribunal Federal para abrir a caixa preta nos orçamentos secretos de 2020 e 2021, estendeu o sigilo para 2022. Simplesmente perdeu o respeito. O STF que se impôs em um embate com Bolsonaro, tropeça agora no parlamento.
O Senado agora cai no mesmo logro do STF.
Como Bolsonaro e seus parceiros do Centrão querem turbinar suas campanhas eleitorais com dinheiro público à revelia de contas públicas, apostaram na miséria e fome que grassam país afora como pretexto para darem um drible na responsabilidade fiscal. Esticaram a corda ao acabarem com o bolsa família.
Em manobras articuladas por Arthur Lira, com a cumplicidade ou apoio explícito de todos os naipes de oposição, o monstrengo constitucional que saiu da Câmara, muito além do Auxílio Brasil, abria bilionário cofre para o governo e a patota multipartidária do Congresso como bem entendessem em ano eleitoral.
Além do calote nos precatórios, que assustou o mercado financeiro, o bilionário cheque em branco para Bolsonaro e para a turma suprapartidária de Arthur Lira ficou exorbitante. Deu ruim para a turma do Senado puxada por Simone Tebet, Alessandro Vieira, Álvaro Dias, Espiridião Amin, Paulo Rocha, José Aníbal, entre outros. Foi o apoio deles, em um acordo com o aval de Rodrigo Pacheco, que assegurou a aprovação no Senado da PEC dos Precatórios sem as aberrações e gulodices do texto vindo da Câmara.
O que se acertou ali foi a imposição de que todo o dinheiro liberado, fora o Auxílio Brasil, seria destinado em áreas sociais, como saúde, previdência e assistência social. Tudo às claras. Rodrigo Pacheco foi o fiador desse acordo.
Em acerto posterior ainda nebuloso, que teve o aval do governo, Rodrigo Pacheco e Arthur Lira concordaram com a promulgação de tudo que o Senado endossou no texto anteriormente aprovado pela Câmara. O relevante nesse trato é a liberação, ainda que tardia, de grana para dar um respiro à multidão que está passando fome país afora. O nó do problema é que na Câmara, dominada pela turma que, nas bancadas governistas e de oposição faturam com o orçamento secreto, não há nenhum compromisso com as correções feitas pelo Senado.
Arthur Lira disse apenas que vai pautar as mudanças feitas no Senado em uma sessão da Câmara na próxima terça-feira. Afirmou que não pode sequer garantir que elas serão votadas, vai depender inclusive do quorum de quem discorda das alterações feitas pelo Senado. Quem conhece como funciona as estranhas parlamentares — em que o Centrão, o PSDB, o PT, o MDB e outros partidos que participam do rateio no orçamento secreto – diz que nada muda na Câmara, é jogo jogado.
A conferir.