As pesquisas mostram o democrata Joe Biden com uma forte vantagem sobre o republicano Donald Trump. Mas, para muitas pessoas, há uma sensação de déjà vu. Afinal, as pesquisas contaram uma história muito semelhante sobre a liderança de Hillary Clinton quatro anos atrás. Podemos confiar nelas hoje?
Há exatamente quatro anos, a mídia tradicional deu a Hillary noventa e um por cento de chance de derrotar Trump. Cinco dias depois, os institutos de pesquisas divulgaram uma pesquisa de rastreamento mostrando que ela estava à frente do candidato republicano por doze pontos. Estimulados pelas pesquisas, os democratas – especialmente as mulheres democratas – começaram o dia 8 de novembro com uma alegre percepção de inevitabilidade. Milhões de dólares foram desperdiçados em festas de comemoração da primeira presidente mulher dos Estados Unidos.
A descrença coletiva começou quando Clinton levou uma surra do candidato republicano no Colégio Eleitoral: como as pesquisas de opinião podiam estar tão erradas? Agora, o enredo parece o mesmo. Os democratas estão pisando em ovos. Biden está liderando Trump por dois dígitos, de acordo com a últimas pesquisas, a pergunta deve ser feita: Os eleitores que esperam uma vitória de Biden estão prestes a cair na mesma armadilha?
As pesquisas não usam bolas de cristais. Elas são instantâneas em um determinado momento no tempo. Na ocasião em que o público tem acesso aos resultados de uma enquete, esse momento já terá passado. É pura história. Há oito anos, quando o republicano Mitt Romney teve um desempenho estelar no debate e, de repente, as pessoas estavam escrevendo o obituário político do presidente democrata Barack Obama.
Então o próximo debate aconteceu. O democrata teve uma excelente atuação no evento. Ninguém esperava por essa virada. E de repente os números estavam mostrando algo completamente diferente. As pesquisas são sensíveis às informações porque as pessoas são sensíveis ao noticiário. Elas são inconsistentes porque os seres humanos são incoerentes. As pesquisas também tendem a variar porque há muitas decisões subjetivas sobre como fazer coisas que diferentes pesquisadores fazem de maneira diferente por uma variedade de razões.
Quando os pesquisadores dependem de telefones fixos, eles tendem a envelhecer os eleitores. A nova geração só usa o telefone celular. A dependência de números de telefone móvel pode deixar de lado os eleitores rurais que não têm serviço de celular. É normal que os entrevistados cujo candidato está perdendo podem não responder às pesquisas, mas eleitores que estão engajados politicamente nas comunidades – e pesquisas mostram que essas pessoas tendem a ser democratas – respondem.
As pesquisas são baseadas em modelos, e as amostras são construídas em suposições sobre quem provavelmente votará e quanto peso dar a cada coorte demográfica naquele universo de prováveis eleitores. Uma pesquisa realizada online em 2016, onde um jovem negro relatou que planejava votar em Trump. Como havia tão poucos homens da mesma raça e faixa etária que estavam sendo entrevistados, sua voz pesou como se representasse o universo dos jovens negros. Isso apenas bagunçou toda a votação, onde foi pesadamente para Trump.
Trump venceu, é claro, e sua vitória destaca a falibilidade inerente das pesquisas. Os pesquisadores não capturam um momento decorrido no tempo, eles não puderam contabilizar os eleitores que se jogaram nos braços de Trump no último minuto, ou as minorias em estados indecisos que sucumbiram aos esforços da campanha do republicano para impedi-los de votar.
E as amostras de votação mal calibradas não refletem com precisão o eleitorado. Há quatro anos, as pesquisas deram peso demais aos eleitores com educação superior, que tendem a votar nos democratas, e não o suficiente para aqueles com menos escolaridade, bem como às pessoas que normalmente não votam. A questão é: como você está construindo a amostra. Isso é especialmente verdade este ano, porque ter uma ideia de quem vai votar nesta eleição é uma questão muito difícil. Depois de 2016, todas as pesquisas passaram a ser oferecidas com a ressalva de que os resultados são significativos se o eleitorado parecer como pensamos que será.
Nas eleições presidenciais no Brasil em 2018, por exemplo, entidades americanas que estavam monitorando a corrida ao Palácio do Planalto davam como certa a vitória de Jair Bolsonaro com 64% dos votos válidos no primeiro turno.
Se a derrota de Hillary nos ensinou alguma coisa, é que as pesquisas nacionais são enganosas e traiçoeiras. Ninguém tinha dúvida que Bill Clinton seria o primeiro marido na Casa Branca. Projetava-se que a democrata venceria Trump na votação popular por cerca de três pontos percentuais, o que se mostrou amplamente correto. Mas, uma vez que as eleições nos EUA não são disputas de popularidade, a melhor maneira de avaliar as chances de um candidato é dar atenção às pesquisas nos seguintes estados: Arizona, Carolina do Norte, Flórida, Michigan, Ohio, Pennsylvania e Wisconsin, onde, em última análise, a disputa será decidida. Essas pesquisas mostram Biden e Trump quase empatados na Flórida e em Ohio; de acordo com a maioria dos institutos de pesquisas, o republicano está à frente no Texas por quase a mesma margem que Biden está à frente no Arizona. Mesmo assim, esses números são significativos? Talvez não.
Frank Luntz, conhecido como o “rei das pesquisas de opinião”, disse à rede norte-americana Fox News na semana passada , se os institutos e órgãos pesquisas estiverem errados sobre os resultados das eleições de 2020 entre o republicano Trump e o Joe Biden, a sua “profissão está acabada” em termos de fé e confiança do público.
Há uma armadilha no mundo das pesquisas eleitorais – o grupo de eleitores que diz aos pesquisadores que não vão votar tem o potencial de votar em uma taxa surpreendentemente alta. Não faz nenhum sentido. Em algumas vezes, os órgãos de pesquisas precisam adivinhar como um segmento da vai se comportar. Mas é difícil e quase impossível, porque não é uma população que existe até a eleição. Por conta disso, a maioria das pesquisas é acompanhada por uma espécie de alerta ao consumidor, a margem de erro, que sinaliza que a pesquisa pode conter erros de amostragens. Não é uma admissão de que a votação pode estar errada. Em vez disso, é a estimativa mínima para a faixa de erro possível em uma pesquisa, um benchmark que mostra a distribuição de resultados possíveis. Um candidato com votação de cinquenta e um por cento com uma margem de erro de três pontos, por exemplo, provavelmente receberá de quarenta e oito a cinquenta e quatro por cento dos votos. Supondo que o outro candidato tenha quarenta e nove por cento dos votos, com a mesma margem de erro, a disputa é, estatisticamente, um empate.
Os republicanos e democratas concordam que as recentes pesquisas sugerem que a margem de erro representa apenas uma parte dos problemas potenciais de amostragem. Não leva em consideração os entrevistados que não entendem o que o pesquisador está pedindo, ou que não estão dispostos a divulgar o candidato a quem estão realmente apoiando. Os institutos de pesquisas sugerem uma solução simples: dobrar a margem de erro. Isso ocorre por causa de todos os outros tipos de problemas e decisões subjetivas que simplesmente não são capturados pela margem de erro como é normalmente construída.
Os recentes números sugerem que, no estado de Wisconsin, por exemplo, Biden subiu dez pontos, com uma margem de erro de quatro pontos, mas ressaltam que Trump ainda pode virar a mesa, com uma vitória espetacular, bem no estilo do Flamengo dos jogadores Raul, Leandro, Antunes, Marinho, Figueiredo, Junior, Andrade, Adílio, Zico , Tita, Nunes, Vítor , Lico e do técnico: Paulo César Capergiani. No título brasileiro de 1982, o Rubro Negro se consagrou como o time do “vira-vira”. Será que Trump tem a mesma estrela do “Flamengo Campeão do Mundo”? No momento, analistas políticos afirmam que seria viável dizer que o vice-presidente Biden está ganhando, Mas, realmente, isso vai se resumir a um punhado de estados, e eles estão mais próximos do que a maioria das pessoas imaginam.O quadro geral das eleições está muito nublado.
As campanhas estão buscando uma compreensão mais dinâmica da intenção do eleitor e recorreram à tecnologia para complementar suas pesquisas internas. As nocas ferramentas são capazes de tratar a mídia social como uma espécie de grupo de foco sempre ativo para obter uma compreensão mais em tempo real das tendências do que com pesquisas. Ao analisar o que as pessoas estão dizendo no Facebook, Twitter, WhatsApp e outros veículos podem ver o que os consumidores/eleitores estão pensando. Com o tempo, conforme começam a ver problemas surgindo com maior frequência em torno do nome de um candidato, enxergam como esses grupos estão falando sobre eles. É positivo? É negativo? E os clientes percebem o que estão divulgando na mídia de transmissão. No final de setembro, os comentários de Trump na Suprema Corte estavam recebendo respostas mais positivas do que os de Biden.
Há empresas que reúnem grupos online, com até dez mil participantes. As pesquisas tradicionais, ao contrário, tendem a consultar entre mil ou mil e quinhentas pessoas. As empresas usam algoritmos para pesquisar em conjuntos de dados massivos por diferentes níveis na linguagem que de outra forma seriam difíceis de identificar. Os participantes são compensados com incentivos não monetários. Os pesquisadores frisam que é importante descobrir onde estão os eleitores indecisos, o que é importante para eles agora, e entender por que estão irresolutos.
A mulher suburbana
Trump quer que “donas de casa suburbanas” gostem e votem nele. Mas, apesar de seus apelos contínuos, as pesquisas indicam que elas não estarão do seu lado antes do dia da eleição. Em seus comícios, o presidente vem pedindo o apoio das donas de casa dos subúrbios. “Façam-me um favor, mulheres suburbanas, vocês poderiam gostar de mim?” Isso acontece depois que ele insistiu anteriormente que a “dona de casa suburbana” vai apoiá-lo, alegando que “elas querem segurança” e reforçando a sua mensagem de que é o candidato da ordem e respeito às leis.
A bibliotecária Cindy Green, moradora de Mahopac- um vilarejo serpenteado por lagos , córregos e encostas densamente arborizadas-, subúrbio da cidade de Nova York, não votou na candidata democrata há quatro anos. “Ela não me inspira confiança”, desabafou a bibliotecária, mãe de três filhas universitárias. Cindy disse que não foi uma decisão muito fácil. Trump foi o vitorioso em Mahopac nas últimas eleições presidenciais. A maioria das famílias do vilarejo são de classe-média alta. A mensagem do candidato republicano é bem recebida pelos moradores que assistem a qualidade de vida deteriorando nos últimos anos.
Alguns institutos estão examinando centenas de milhares de postagens de mídia social para determinar qual candidato está vencendo a corrida. Usando um processador de linguagem natural para extrair o que seus algoritmos determinam ser as informações mais relevantes, atualmente mostra Biden ligeiramente à frente de Trump, com uma vantagem tão estreita que dificilmente é uma vantagem. É muito cedo para saber se esse modelo de pesquisa será mais preciso do que a pesquisa tradicional.
Claro, em comparação com 2016, há tantas variáveis exclusivas este ano que é improvável que as pesquisas sejam capazes de refletir todas elas. Mas os institutos estão com olhos abertos e ouvidos abertos em todas as direções. Mesmo dobrando a margem de erro pode ser inadequado. Os eleitores estão indo às urnas durante uma pandemia. É muito sofrimento e dedicação cívica.
Os republicanos intensificaram seus esforços para impedir que as pessoas votassem – e que alguns votos fossem contados. Centenas de milhares de eleitores já votaram pelos correios, embora o presidente da empresa tenha intencionalmente tentado retardar o envio das cédulas eleitorais. Cerca de 60% dos democratas terão votado até o dia da eleição. O eleitorado está energizado e comparecendo a um número sem precedentes. Também está mais polarizado do que nunca. Alguns democratas já querem celebrar a vitória de Biden, mas o que assistimos é uma disputa muito acirrada e sem previsão.