O Brasil cresce e às vezes recresce por saltos. Nessa toada de sapo, a gente alterna momentos de euforia com depressão. Por causa de várias razões, a principal delas a cegueira de nossas elites e dos governantes de plantão, o país cria e perde oportunidades de superar as mazelas que o mantém entre os campeões de desigualdade social no planeta.
É inacreditável em uma terra com tantas riquezas naturais, que há séculos alimentam impérios, suas elites sigam ignorando a realidade e posem como modernas e liberais pra inglês ver. Mas, para dentro de seus inúmeros quadradinhos, seguem usando como régua alguma medida herdada dos tempos áureos ( e põe áureo nisso) da escravidão.
Não importa se a gente gosta ou não do Lula, na sua posse ele pôs a mão inteira nas nossas mais expostas feridas. Desenhou na subida da rampa do Palácio do Planalto. Mas, na sua fala no Parlatório presidencial, que manteve o pique do bom discurso no Congresso Nacional, ele descreveu o que todos nós vemos todos os dias nas ruas.
A miséria está tão escancarada que, mais por impotência do que insensibilidade, é comum fingir que não vê. É como o ato automático de fechar a janela do carro diante do sinal fechado, e assistir aos apelos em papelões como se não os enxergássemos. Meu amigo, parceiro e irmão Orlando Brito me enviava diariamente fotos com esses gritos de socorro que registrava inclusive nas mais variadas esquinas do poder.
É mais do que hora de quem tem como contribuir ajudar a virar esse jogo. As elites econômicas com certeza. A elite política que enriquece à sombra do poder também. Faltou, aliás, nos discursos de Lula e do senador Rodrigo Pacheco algum compromisso com o combate à corrupção — nas falas no Congresso minha dúvida é se evitaram falar de corda na casa do enforcado.
A corrupção é um entrave real às políticas de redução das desigualdades. Os abutres de todos os tamanhos tentam bicar nacos nas verbas sociais. Eles são rápidos e espertos, costumam ter sucesso na ronda a quem estar no poder e a seus sucessores. Essa é uma peleja a ser enfrentada em governos de qualquer naipe.
Depois de toda essa tensão causada por Bolsonaro e sua trupe, em que desde o fim da ditadura militar a democracia não tinha corrido tanto risco, não basta ter estancado o golpe anunciado, armado e por pouco não concretizado.
É preciso fortalecer a armadura de defesa da democracia, inclusive nos campos institucional e legal. Mas o mais importante é reduzir drasticamente a desigualdade social, com o acesso de dezenas e dezenas de milhões de brasileiros à uma vida digna, com comida, saúde, educação e lazer.
Além de todas as dívidas históricas, o país agora deve ao voto dos pobres a manutenção da democracia. É hora de começar a pagar com seriedade e sem corrupção.
A conferir.