Sou muito criterioso e evito o mais que posso fazer relatos na primeira pessoa. Mas nesse caso, não há como deixar de fazê-lo porque julgo ser realmente bem oportuno. Uma maneira de aproximar o leitor de algo que poucas, pouquíssimos colegas de profissão e mesmo demais pessoas tiveram a primazia de ver de perto. Somente eu e mais quatro colegas fotógrafos.
A profissão de jornalista está sempre a me colocar diante de situações as mais antagônicas e suprendentes. Perdi a conta de quantas vezes estive frente-a-frente de acontecimentos de caráter, interesses e ideologias inteiramente opostas. Ainda mais quando meu foco está voltado para as questões do Poder, do comando da República. Foi o que me aconteceu nessa quinta-feira, 7 de outubro, faltando um ano para as eleições presidenciais.
Como sabemos, estão já postas duas candidaturas à Presidência do Brasil. A de Jair Bolsonaro, atual ocupante da principal cadeira do Palácio Planalto e pretendente à reeleição. A outra, de Lula, que já a ocupou por oito anos. Pelo que ví, a campanha eleitoral, a luta pelo voto de 2022 começa a sair das posições até agora digamos discretas.
Pela manhã, Luís Inácio teve agenda na periferia da Capital. Foi ao Complexo de Materiais Recicláveis, o resíduo das ruas. De tênis e calça jeans, ficou por lá duas ou três horas. Visitou acompanhado de correligionários o galpão onde se recicla o lixo. Tirou fotos com admiradores, caminhou e cumprimentou velhos amigos. Por fim, discursou. Falou para uma plateia de 200 catadoras e catadores sobre o custo de vida, o preço dos combustíveis e dos alimentos, do desemprego. Disse que a fome não é fenômeno da natureza e sim da irresponsabilidade daqueles que governam o país: — As pessoas vão para a porta do açougue esperar um osso e não tem dinheiro para comprar um quilo de carne. Arrematoudizendo que conta com apoio de todos para mudar o Brasil.
Após cobrir o encontro do ex-presidente, fui, à tarde, para o evento no Palácio Planalto em que Jair Bolsonaro falou sobre Segurança no Trabalho para um público de 100 convidados. Ressaltou a excelência da gestão de seus ministros. Reclamou da imprensa, como sempre faz. Do púlpito reservado ao presidente, explicou o alto preço da gasolina. Referindo-se a Lula, disse que o eleitor quer reeleger “o cara” que quanto esteve à frente do Planalto, financiou refinarias na Venezuela ao invés de fazê-lo no Brasil. Ao contrário de Lula, Bolsonaro não usou máscara. Ao contrário de Lula, que tomou vacina contra a Covid, Bolsonado novamente descartou a necessidade de imunização.
Enfim, foi assim que nessa quinta-feira, com minha profissão pendurada no pescoço, vi de perto dois momentos a performance de dois homens, dois extremos, dois candidatos, na mesma cidade, no mesmo dia. Fui do chão de barro ao piso de mármore. Da central de reciclagem de detritos ao palácio presidencial. Como se diz, do lixo ao luxo. Ah, lembro-me que tanto Lula quanto Bolsonaro fizeram referência ao papel higiênico.