Lá pelo final dos anos 70, um grande amigo, carinhosamente chamado de Chicão, ou Francisco de Paula Oliveira, me convidou para dar aula num cursinho pré-vestibular. Vivíamos o início da valorização dos cursos de preparação para as provas de acesso às universidades públicas. Um professor de história adoeceu e criou um problema: a vacância numa disciplina obrigatória nas provas do vestibular. Exatamente o curso que eu estudava na UnB. Estudava em termos, era um péssimo aluno, buscava apenas o mais ou menos nas matérias ofertadas. Na realidade, os hormônios da juventude eram responsáveis por atropelar as prioridades, ou invertê-las. E elas estavam no curso de Letras.
Voltando então, mesmo assim aceitei o convite do meu amigo. Se ele achava que eu podia, não o desmentiria. E a grana era boa. Garantiria três meses de mochila do Rio de Janeiro ao Ceará. Acho que fui um bom professor, mas isso só os alunos de então podem dizer. Depois, muitos anos para a frente, fui professor de jornalismo já no ensino superior. Tempos distintos, ocasiões diferentes. Uma característica permeou as duas experiências: o bom humor para ministrar as aulas. Tenho como provar isso, não é culhuda, como se diz na Bahia. Então, eis que surge um aluno da época. Ele me cobrou uma análise com bom humor para sacanear a rapaziada que professa o eufemismo acanalhado de intervenção militar, já que não tem coragem de chamar de golpe.
Juro que tentei. Pensei em utilizar o recurso de usar a narrativa de contar uma estória. Tipo: era uma vez a ditadura militar, saiba quem quiser, havia corrupção, bandidagem, tráfico de drogas, inflação, obras inacabadas e muita, muita sacanagem. Havia também tortura, censura e execuções sumárias. Educado, disse ao meu ex-aluno sem pestanejar:– Não há como falar da ditadura com bom humor. O horror não permite um sorriso sequer.
Por isso, é hora de dizer com veemência não a tudo que represente esse retrocesso. Incluindo aí essa excrescência do Bolsonaro.