Uma das características deste primeiro quinto do século XXI é a polarização política exacerbada. De tal maneira que a refrega se espraia à economia, à intimidade das famílias, às relações de trabalho e, claro, à imprensa.
Defenestrar jornalistas não é novidade. Honoré de Balzac, em Ilusões Perdidas, no século XIX, alcunhava as redações de “lupanares do pensamento”.
Numa sequência frenética de colóquios, Balzac definia o fascínio que jornais exerciam sobre jornalistas. “Você ficará de tal modo encantado de exercer o poder, de ter direito de vida e de morte sobre as obras do pensamento, que se tornará jornalista (…)”.
“Quem tudo pode dizer, tudo consegue fazer!”. E desfechava: “Se a imprensa não existisse, seria preciso não inventá-la”.
Vaza-Jato x Lava-Jato
Em terras brasilianas não é diferente. Os grandes veículos de comunicação sempre foram atacados – muitas vezes com razão. Nesses anos de redes antissociais, no entanto, as críticas à mídia parecem esquizofrênicas.
Os principais veículos são apedrejados por serem lulistas, por uns, e bolsonaristas, por outros.
Quando o site The Intercept Brasil estreou a Vaza-Jato, divulgando diálogos pessoais entre os procuradores da Lava-Jato e o então sufeta de Curitiba, Sergio Moro, a desconfiança era ampla. Afinal, seu principal fiador, o jornalista Glenn Greenwald, é simpático ao PT de Lula.
Eis que o The Intercept estabeleceu uma parceria com o matutino Folha de S. Paulo e passou a divulgar diálogos exclusivos cedidos por Greenwald. Ponto para a Vaza-Jato.
Nesta sexta, 5, foi a vez da revista Veja lustrar um pouco mais a Vaza-Jato. Na capa, o hebdomadário considerado pelo PT como esbirro da chamada direita, concluiu: “Sergio Moro cometeu irregularidades, desequilibrando a balança em favor da acusação nos processos da Lava-Jato”.
Vaza-Jato 2 x 0 Lava-Jato. Na noite de sábado, foi a vez da TV Globo, que já vinha dando destaque ao tema, ampliar o placar.
“A Veja diz na seção Carta ao Leitor que analisou dezenas de mensagens trocadas ao longo dos anos entre membros da revista e os procuradores e que todas as comunicações seriam verdadeiras, palavra por palavra”, respaldou o Jornal Nacional. Como os repórteres de Veja, os da Folha de S. Paulo já tinham concedido o mesmo atestado ao The Intercept.
“Os principais veículos são apedrejados
por serem lulistas, por uns,
e bolsonaristas, por outros”.
Agora, neste domingo, 7, o Datafolha empresta mais um pouco de credibilidade à Vaza-Jato. Para 58% dos entrevistados, a conduta de Sergio Moro foi “inadequada”.
Também para 58% as decisões do sufeta de Curitiba devem ser revistas. Isto não vale para Lula, já que 54% são favoráveis à prisão do ex-presidente – mesmo índice de abril deste ano.
A aprovação da Lava-Jato mantém-se majoritária, mas caiu de 61%, em abril, para 55%, hoje. Por fim, a avaliação de Moro como ministro minguou de 59% para 52%.
Intriga da oposição
Sergio Moro e seus escudeiros do Ministério Público podem continuar dizendo que não reconhecem os diálogos vazados pelo The Intercept. É a tática do momento.
Caso os números negativos das pesquisas continuarem subindo e a mídia tradicional mantiver seu aval ao The Intercept, o sufeta de Curitiba terá que encontrar outra desculpa. Ou prova que os diálogos são falsos e adulterados, ou apresenta explicações convincentes.
Até aqui, fosse uma partida de futebol, a Vaza-Jato estaria goleando a Lava-Jato. No campo da coerência política, porém, o jogo está empatado.
A chamada esquerda age como sempre. Se a notícia lhe é contrária, é armação da direita. Se é favorável, divulga-a como verdadeira.
A chamada direita, recém-saída do armário, adota comportamento semelhante. Como aquele ministro que perdeu o emprego por dizer a verdade: “O que é bom a gente fatura, o que é ruim a gente esconde”.