O entrevero entre os presidentes da República e da Câmara – e, por extensão, com o Parlamento – indicou que a Nova Previdência corre perigo. Afinal, só quem ganha com os insultos trocados entre Jair Bolsonaro e o deputado Rodrigo Maia é a oposição.
Aos oposicionistas não interessa aprovar a reforma das aposentadorias. Em parte, porque discordam dela. Mas, em grande dose, porque sabem que, sem as mudanças do sistema previdenciário, o primeiro governo da chamada direita, após 24 anos de domínio da chamada esquerda, naufraga.
O naufrágio viria por dois caminhos. Um econômico e outro político.
Primeiro, porque para boa parte dos economistas – inclusive alguns da oposição – o Brasil vai se tornar insolvente, sem dinheiro para gastar sequer com o custeio essencial. Como consequência, quem planeja investir, desistirá.
Sem investimento, nenhum país cresce. Como os brasileiros vão continuar procriando, haverá mais habitantes para uma renda estagnada ou regressiva. Segue-se o empobrecimento.
Segundo, e mais relevante a curto prazo, provocará violento desgaste político ao novo governo. A percepção (real) será a de que o capitão-mor não tem apoio político. E sem apoio político, presidentes são abelhas rainhas sem colmeia. Não produzem nada.
O desgaste pode se tornar maior caso o Posto Ipiranga abandone o Governo. Afinal, o ministro da Economia, Paulo Guedes, coloca todas as suas fichas na reforma.
Sem ela, a planejada mudança de 180º na política econômica sofre revés brutal. O plano B de Guedes, o orçamento base zero, é quimera.
Renda e inflação baixa
Assim, sob estes dois aspectos, não aprovar a reforma é um desastre para o Governo Bolsonaro. Suficiente, talvez, para comprometer o restante de seu mandato, já que, na nova ou na velha política, à patuleia interessa emprego e poder de compra. Ou renda e inflação baixa.
Parece claro, assim, que o maior perdedor da escaramuça Bolsonaro x Maia é o presidente da República. Resta que, ou Bolsonaro não entende de articulação política, ou ele não está interessado em aprovar a reforma da previdência.
Diferente do presidente da República, Maia é genuinamente liberal e favorável à alteração dos sistemas de aposentadorias brasilianos – o ultra-camarada dos servidores e o da maioria dos brasileiros, aquele que garante apenas a sobrevivência.
Mesmo que a posição de Maia fosse de neutralidade, o presidente da Câmara (assim como o do Senado) não pode ser desprezado pelo chefe do Executivo. Simplesmente porque a maioria das leis não são aprovadas sem o beneplácito de ambos.
Logo, Bolsonaro deveria tratá-lo, no mínimo, com deferência. Como fizeram seus antecessores bem-sucedidos na aprovação de leis e emendas constitucionais – FHC, Lula e Temer. Sem dizer que os três completaram seus mandatos.
“Ou Bolsonaro entende de articulação política,
mas não quer aprovar a reforma.
Ou, caso queira aprová-la,
pouco sabe sobre articulação política”.
É claro que Rodrigo Maia também perderá, pois é de pouca serventia um presidente de uma Câmara que não aprova legislação importante. Mas o grande prejudicado será Bolsonaro, que terá que explicar um fracasso logo no primeiro ano de governo e numa proposta crucial para o País.
Desta maneira, diante destas circunstâncias, há duas hipóteses mais prováveis. Bolsonaro entende de articulação política, mas não quer aprovar a reforma da previdência. Ou, caso ele queira aprovar a Nova Previdência, pouco sabe sobre articulação política.
Chamem o Mourão
Na primeira hipótese, parece estar agindo para jogar a conta do eventual fracasso no que ele chama de “velha política”, que estaria representada por Maia e boa parte do Parlamento. Mas, neste caso, é de supor que o primeiro mandatário do Brasil saiba o passo seguinte.
Como no xadrez, a cada lance da política é preciso prever três ou quatro jogadas à frente. Difícil imaginar, porém, que lance seria este. Mas, vá lá, ele ganhou uma eleição sem que ninguém previsse.
Menos provável, caso entenda de articulação e queira aprovar a reforma, o presidente tem que explicar o que ele e seus filhos estão fazendo, já que suas atitudes beligerantes não condizem com o objetivo aparente. Ao contrário, dificultam a tramitação no Congresso Nacional.
Na segunda hipótese mais provável, o Brasil está numa enrascada. Um presidente incapaz de articular sua base – ou, pior, sem base – simplesmente não governa.
A última possibilidade é a de que Bolsonaro não saiba articular e não queira aprovar a reforma. Nestas duas últimas hipóteses, atraquem o navio e chamem o Mourão. Na democracia brasiliana, é o que resta.