O governo piscou. Pela primeira vez, foi ágil na hora de demitir um funcionário acusado de corrupção, no caso o ex-diretor deLogística da Saúde, Roberto Ferreira Dias, ligado ao líder Ricardo Barros e suspeito de cobrar propina na compra de vacinas. O gesto denota preocupação. Planalto, porém, está longe de se desvencilhar das mais graves denúncias já feitas até agora no governo Jair Bolsonaro.
Entre aliados de Bolsonaro, o sentimento é de que pode até não haver – ainda – votos suficientes para aprovar um impeachment ou um processo criminal contra o presidente, mas ele precisará fazer mais para se manter no cargo. A primeira providência lógica agora seria jogar também ao mar o líder Ricardo Barros – o que agradaria o presidente da Câmara, Arthur Lira, e parte do entorno presidencial.
O problema, sobre o qual se debruçam hoje os palacianos, é aferir o grau de periculosidade política do atual líder do Governo. Barros, a quem se atribui o comando do esquema que atua na Saúde, é uma raposa velha da política. Tão esperto que esteve na base aliada de quase todos os governos mais recentes. Sabe de muita coisa, e teria munição para explodir o quarteirão se não sair por bem – leia-se, numa negociação com o Planalto que lhe dê alguma vantagem.
Qual, a essa altura, é difícil saber. Mas todos sabem o estrago que o fogo amigo pode fazer dentro de um governo. Já fragilizado politicamente, Bolsonaro resistiria ao tiroteio do líder? Há semanas, quando Lira – adversário interno de Barros no PP – pediu ao presidente a cabeça de Barros, não levou. O Planalto deve ter tido lá suas razões, que ainda devem estar valendo.
Nos próximos dias, a CPI da COVID vai ouvir os novos personagens do drama, envolvidos nos casos de suspeitas em torno das negociações da Covaxin e da Astrazeneca. Esta última entrou inesperadamente na roda com a denúncia de Luiz Paulo Dominguetti sobre a cobrança de propina de US $ 1 por dose a ser vendida.
A única certeza hoje em Brasília é que a sangria na imagem do governo, que perdeu de vez o discurso da corrupção, vai continuar. E que, com ou sem Barros, haverá um racha no centrão que pode marcar o início da debandada. É por esse caminho que a possibilidade de afastamento de Bolsonaro pode crescer.