O PIB está preocupado. Não a ponto de apoiar o candidato do PT, mas alguns de seus integrantes começam a detectar a contradição básica de um eventual governo Bolsonaro: no fundo, o presidente e seu Posto Ipiranga têm visões do mundo e da economia muito diferentes, e não há garantia de que a receita liberal que encantou o mercado no primeiro turno vá ser seguida.
Na quarta, o dólar subiu, a Bolsa caiu e esse pessoal foi dormir com os cabelos em pé por causa das declarações de Bolsonaro sobre a reforma da Previdência e sua resistência em privatizar a Eletrobras. Ajeita daqui, desmente dali, mas quem conhece o candidato do PSL sabe que é apenas o começo. Vai ser assim o tempo todo, o governo inteiro – ou, ao menos, enquanto o economista Paulo Guedes durar nele. Sem contar outros personagens.
Jair Bolsonaro não é exatamente um contemporizador.
É um capitão radical que fala em autoridade o tempo todo e já enquadrou até o general vice. Hierarquia será um forte componente de seu governo, se chegar lá. Não se sabe também o real grau de convicção do candidato do PSL à ortodoxia do liberalismo econômico que passou a pregar na campanha. Pode ter se convencido de fato? Poder, pode.
Mais provável, porém, é que a conversão bolsonariana ao receituário ultraliberal de Paulo Guedes tenha muito mais de estratégia eleitoral do que de convicção, e que as diferenças comecem a aflorar no dia-a-dia – como, aliás, já está acontecendo na campanha. Ninguém deixa de ser nacionalista, nem corporativista, de uma hora para outra, assim como não se troca de religião num piscar de olhos.
O antipetismo do mercado e de parte do PIB desenhou, no primeiro turno, um conto de fadas no qual o dragão da esquerda seria morto pelo príncipe encantado do liberalismo, encarnado por Paulo Guedes no reino de Bolsonaro. As reformas, como a da Previdência, seriam retomadas, as estatais privatizadas, as amarras ao capital desatadas, a confiança dos investidores recuperada.
Não bastaram nem três dias de campanha no segundo turno para perceber que a coisa pode não ser bem assim. Por mais que Jair Bolsonaro se poupe de debates e sabatinas no segundo turno – e essa é exatamente a estratégia de sua campanha – vai ficar difícil fugir às contradições e à impressão de que elas vão continuar num hipotético governo.
Todo governo tem lá suas divergências, e o do PT de Fernando Haddad não escaparia delas, também passando a impressão de que os pilotos estão em constante desentendimento sobre a rota na cabine do avião. No caso de Bolsonaro, porém, provavelmente teremos um presidente que não hesitará em atirar o discordante porta afora do avião.