Frustraram-se os que acreditavam que a prisão do ex-presidente Lula levaria as massas revoltadas às ruas. Mas erraram também redondamente os que achavam que, com Lula preso – e cumprindo pena claramente exagerada por receber favores de empreiteiros num triplex classe média do Guarujá – iriam se livrar dele e a vida seguiria normal.
Dois meses depois, fica claro que não é assim. Além das consequências político-eleitorais mais óbvias, o encarceramento do ex-presidente mexe em camadas profundas da opinião pública e em valores que norteiam percepções e decisões da sociedade em relação à política. Resumindo: mudou a altura do sarrafo, e a exigência em cima da punição de outros políticos, inclusive presidentes e ex-presidentes, fica redobrada.
Não fosse assim, Fernando Henrique Cardoso não estaria hoje em destaque em todos os noticiários por ter, lá nos idos de 2010, mandado e-mail a Marcelo Odebrecht pedindo que a empreiteira contribuísse para a campanha de dois correligionários candidatos ao Senado: Antero Paes de Barros (MT) e Flexa Ribeiro (PA).
Qual foi o crime de Fernando Henrique? Não está claro. Não há referências a caixa 2 e nem vestígios de que o ex-presidente, já ex há muito nessa ocasião, tenha oferecido algo em troca das doações. Que nem mesmo ilegais eram, pois na época a lei permitia a contribuição eleitoral de empresas, posteriormente revogada pelo STF. Lá está FHC exposto no noticiário como poucas vezes antes, embora dificilmente, no aspecto jurídico, o caso vá resultar em alguma coisa.
Diante dessa nova regra, ou padrão moral, sobretudo para presidentes e ex-presidentes, o que dizer de Michel Temer, que escapou a duas denúncias por obra e graça de sua base parlamentar mas ver-se-á diante delas, e certamente de outras, em mais alguns meses, quando deixar o cargo?
Sem o foro privilegiado e a blindagem do Congresso, Temer vai encarar a Justiça de primeira instância. No padrão aplicado a Lula, se forem verdadeiras as acusações de que, nas investigações em curso, Temer tem sido alvo, o atual presidente corre o risco de pegar prisão perpétua. Afinal, se um triplex vale 13 anos, o que se dirá do conjunto da obra atribuída ao peemedebista?
O que se indaga agora é se as coisas vão permanecer assim ou se, lá para novembro ou dezembro, o Legislativo que se despede não aprovará mudanças na lei que aliviem a situação de Temer e outros. E Lula? Pode ser solto, pois a eleição já terá passado.