As atenções dos meios políticos estão voltadas para a iminente demissão do chanceler Ernesto Araújo, mas uma outra crise tão ou mais grave vai se desenhando no horizonte militar. A morte ontem de um soldado da PM baiana, Wesley Soares Góes, pelo BOPE, depois que entrou em surto psicótico e começou a dar tiros de fuzil no Farol da Barra, em Salvador, está sendo politizada nas redes de bolsominions, inclusive por parlamentares, e pode virar foco de novos motins de policiais militares nos estados.
De manhã, a deputada Bia Kicis, presidente da CCJ da Câmara, chegou a postar tuíte – retirado logo depois – em que chamava o soldado de “herói” e dizia que ele teria sido abatido pelos colegas por se recusar a cumprir “ordens ilegais”do governador da Bahia, Rui Costa. A sugestão dos bolsonaristas é de que o soldado estivesse se reusando a obedecer as medidas para fiscalizar as restrições decretadas no estado por causa da pandemia. Outros simpatizantes do presidente passaram a usar as redes para incitar uma paralisação dos policiais militares.
No momento, a situação parece controlada, mas o episódio provoca grande apreensão entre políticos e comandantes militares. Na interpretação de alguns, Jair Bolsonaro vem provocando uma indevida politização das forças militares, inclusive das PMs, que fazem parte de sua base de apoio social depois de receber aumentos e tratamento privilegiado em relação a outras categorias.
Já houve motim no Ceará e problemas em outros estados, sobretudo naqueles governados por petistas. Até mesmo políticos de partidos do Centro consideram incômoda e indevida a proximidade do presidente da República com as polícias militares.
A nomeação de milhares de militares, que hoje ocupam o governo do primeiro ao quinto escalão, também deixou as Forcas Armadas em situação delicada, o que é reconhecido por oficiais da ativa. Esses setores defendem sua atuação como instituição de Estado, e se constrangem com a identificação de seus integrantes ao governo, ocupando postos desgastantes, como a Saúde com Eduardo Pazuello. E não se trata apenas de uma questão de imagem. A mistura entre governo e militares e os discursos inflamados frequentes do presidente para a tropa alertam para um dos riscos mais temidos por seus comandantes: a quebra da hierarquia.
O problema é que Bolsonaro não para. Mal conseguiram se livrar do peso de Pazuello liderando as ineficientes ações do governo na pandemia, os militares estão prestes a cair numa outra chapa quente. O almirante Flavio Rocha, hoje chefe da SAE e interino da Secom, é o nome mais cotado no Planalto para substituir Ernesto Araújo no Itamaraty.