A continuarem as coisas nessa toada, serão necessários alguns anos para se avaliar a dimensão e as consequências do retrocesso representado nas relações exteriores pelo governo Bolsonaro, que ainda nem completou três meses. O pragmatismo na política externa das últimas décadas – uma raridade capaz de produzir concordância entre os tucanos e os petistas que se sucederam no poder por quase 25 anos – está sendo substituído por uma ideologização que, nesse curto período, já produziu fortes desdobramentos.
Só lembrando por alto, provocou: a) um esfriamento das relações com nosso maior parceiro comercial, a China; b) botou o país numa encalacrada com os árabes que compram a maior parte de nossa proteína animal por causa da promessa a Israel de mudar nossa embaixada para Jerusalém; c) implodiu o Mercosul e o Brics; d) por pouco, não colocou o Brasil na tremenda fria que seria permitir que os americanos usassem nosso território para uma eventual ação militar na Venezuela – descartada liminarmente pelos militares brasileiros.
É de se imaginar que a imagem símbolo que vai ficar para as gerações posteriores que se interessarem por essa época, e não só pela política externa, será captada nos próximos dias na visita do presidente Jair Bolsonaro aos Estados Unidos, para onde seguiu neste domingo. Trump e Bolsonaro no Salão Oval? Pode ser. Quem sabe não será a foto dos dois dando entrevista lado a lado no Jardim da Casa Branca?
Talvez não. A viagem aos Estados Unidos também poderá deixar o desenho simbólico do que se passa aqui em casa – o retrocesso nos costumes, o radicalismo político-ideológico e um estranho jeito de governar.
Pode sair de lá o retrato de um estado de coisas que leva um presidente da República a nomear e demitir integrantes do primeiro e do segundo escalões segundo as vontades de um filósofo brasileiro residente nos EUA que não se cansa de, entre palavrões, falar mal do governo que lhe parece ser tão obediente.
Sim, a foto de Bolsonaro com Olavo de Carvalho, tratado com honras e convidado a jantar com o presidente, poderá ser a imagem-síntese do momento histórico e dizer tudo a respeito deste governo.
Depois de criticar e xingar integrantes diversos da administração, entre eles o vice Hamilton Mourão – que, claro, não foi nomeado por ele -, Olavo de Carvalho compareceu no sábado à noite a um evento organizado pelo guru da extrema direita americana, Steve Bannon. Foi perguntado sobre o que achava do governo do sujeito com quem se encontraria algumas horas depois, e que lhe é tão fiel, e tascou: “Não precisa mudar nada para ficar mal. É só continuar assim. Mais seis meses, acabou“. Só isso.