Os dados da PNAD contínua do IBGE vieram implacáveis, confirmando o que já se percebia: a miséria aumentou, a desigualdade se acirrou, desde 2012 os ricos ficaram mais ricos e os pobres ficaram mais pobres. Metade dos brasileiros vive com renda de R$ 413 mensais, o 1% mais rico ganha em média R$ 16 mil por mês. Sempre fomos um país pobre, miserável. Mas o movimento, que até 2014 era de tirar pessoas da pobreza, inverteu-se e cresce de maneira acentuada com sinal contrário:de lá para cá, o número de brasileiros na pobreza extrema (os que vivem com menos de US$ 1,90 per capita por dia) passou de nove milhões para 13,6 milhões. É mais ou menos como se, em cada um dos últimos cinco anos, mais um milhão de pessoas tivesse entrado na miséria.
Ainda que previsíveis, os números espantam. Mas o que surpreende mais é a cara de paisagem do poder público nesse debate. O IBGE divulga, mas o Planalto, o Ministério da Economia, as pastas que cuidam das questões sociais e o Congresso seguem com suas pautas, sem abrir espaço a uma óbvia e necessária discussão sobre ações emergenciais para resolver, ou ao menos amenizar, a escalada da miséria. Essa é a pauta que ninguém quer ver, e vai muito além de liberar o FGTS ou dar um décimo terceiro temporário ao Bolsa Família.
O argumento – ou a desculpa – das elites políticas, emprestado ao establishment económico, é o de que, votando a aprovando as reformas na economia, moldadas pela agenda liberal de Paulo Guedes, estão trabalhando para ajustar as contas, atrair investimentos, gerar empregos e, lá no fim da linha, reduzir a pobreza como consequência disso tudo. Só que não é assim, ao menos para quem perdeu o emprego, se afoga nas contas atrasadas, passou a morar de favor – ou na rua – e, daqui a pouco, não terá mais nem como se alimentar.
O lado mais nefasto da radicalização política que vive hoje o país talvez seja esse dar de ombros de boa parte dos políticos, sobretudo os do governo, à miséria que aumenta. É como se, ignorando os dados do IBGE, eles não existissem – e não trouxessem à memória coletiva a narrativa dos governos dos adversários petistas, que tiveram como obra principal a retirada de milhões de pessoas da pobreza. Como eles não gostam do PT, e morrem de medo que ele volte, ignoram a pauta da miséria. Não dão o braço a torcer para encarar o problema de frente.
A miséria não tem cor nem partido. Quem se elege num país como o nosso não pode deixar de ter a questão social como centro de tudo. Até porque esse pessoal todo vota.