Nossas tias que votaram em Bolsonaro continuam com os celulares nas mãos, recebendo e replicando mensagens de grupos de WhatsApp que já atuavam na campanha. O esquema do ex-candidato e agora presidente eleito nas redes continua operando com o mesmo entusiasmo, e agora as mensagens que tinham Fernando Haddad como alvo têm na mira outros adversários – como, por exemplo, as ONGs que se opõem à fusão entre Agricultura e Meio Ambiente. Nada indica que a máquina bolsonariana de fabricar e propagar news nas redes vai parar.
O próprio presidente eleito tem preferido, a exemplo de Donald Trump, usar o Twitter para fazer anúncios, como os de novos ministros, e desmentir informações vazadas por integrantes da equipe à grande mídia. Na primeira semana após a eleição, Bolsonaro deu uma única coletiva à imprensa – da qual deixou de fora os jornalistas de veículos impressos – e fez dezenas de tuítes, vídeos e ‘lives’.
Pode parecer muito moderno e democrático ter um presidente que acompanha as novas tendências e se expõe nas redes. Aliás, nem é tão novo assim. Os vídeos de Michel Temer apontando o dedo podre para aliados que o traíram foram um capítulo tragicômico na campanha eleitoral.
O recurso às redes, quando inserido numa política mais ampla de comunicação presidencial e de governo, é hoje essencial, muito útil tanto para a construção da imagem do governante quanto para aferir humores e comportamentos de parte do eleitorado.
Não é nada saudável, porém, e nem bom para a democracia, quando se destina a preservar o governante de contatos mais diretos com a mídia, substituindo mediadores com a sociedade em ocasiões em que seriam necessários, eliminando possíveis questionamentos e confronto de ideias. Ao anunciar decisões pelo Twitter, o presidente se exime de explicá-las.
Além disso, corre o risco de, como acontece frequentemente com Trump, falar bobagens intempestivamente e de improviso. É óbvio que, nos dias de hoje, o chefe do Executivo tem que estar conectado. Mas ele tem à sua disposição uma série de filtros, e deve usá-los quando preciso, sob o risco de se arrepender de declarações desnecessárias e extemporâneas.
Pior ainda será manter com o mesmo ímpeto e agressividade, numa espécie de comunicação paralela de governo, os grupos de WhatsApp que comandaram a guerra na campanha eleitoral e, inclusive, estão sendo investigados sob acusação de espalhar notícias falsas e serem financiados por empresários. A necessária pacificação do país, que parece ser meta inatingível, só terá uma chance mínima de vingar se começar com um esforço para por fim à selvageria nas redes.