Poderia ter sido o ano da Justiça – e de seu contrário, representado pelos procuradores e juízes midiáticos que exprapolam seu papel e pelos políicos que jogam o tempo todo para abafar a Lava Jato. Poderia ter sido o ano da recuperação econômica, mas ela veio tênue, vagarosa e dirigida a poucos, sem aplacar o desemprego e a precarização do emprego, jogando no abismo da pobreza muita gente que achava que tinha saído de lá. Poderia ter sido o ano de reformas necessárias no Estado, mas elas vieram com o vicio de origem de mandar, como sempre, a conta para quem não pode pagar mais.
2017 não foi nada disso. O traço marcante deste ano que acaba em poucas horas foi, isso sim, a cara-de-pau. Na política, sobretudo, para onde olharmos, vamos encontrar nessa figura macunaímica do homem público brasileiro os sinais de que se chegou a um limite sem precedentes em matéria de escancaramento e caradurismo. Perderam-se de vez os escrúpulos e a vergonha.
Dificil eleger o campeão da cara-de-pau 2017, mas é certo que no Palácio do Planalto há fortes candidatos. Basta recordar dos ziguezagues do governo Temer, que tomou decisões polêmicas com a maior seriedade e seguidamente recuou – ou foi obrigado a recuar – fazendo ares de João-sem-braço? A Renca, o decreto do trabalho escravo, o indulto de Natal…
Quem não se lembra de Michel Temer, no início do ano, prometendo que afastaria do cargo os ministros que fossem denunciados pela Lava Jato? Daria vontade de rir, se o caso não fosse de chorar, pois uns meses depois estaria o próprio presidente no alvo de duas denúncias, detonadas a partir de gravações de sua conversa com o empresário Joesley Batista na noite do Alvorada. Aliás, tem diálogo mais cara-de-pau do que esse, entre o “isso tem que ser mantido, viu”, e o sujeito que se achava o rei da cocada-preta, fora do alcance da Justiça?
O Congresso Nacional, com a Câmara dos Deputados na dianteira, foi outro forte concorrente ao prêmio de cara-de-pau do ano. Tem atitude mais cara-de-pau do que derrubar uma presidente da República por “pedaladas fiscais” e depois garantir a permanência de outro no cargo enterrando duas (não foi uma só…) denúncias por corrupção?
Pois é. E nem falamos da disputa individual entre os caras-de-pau que puxaram malinhas com rodinhas cheias de dinheiro pelas ruas e os que as guardavam, aos montes, em apartamentos em Salvador. Mas o espaço não dá para falar de todos.
Saindo do Executivo e do Legislativo, vamos encontrar muitos catas-de-pau no Judiciário e no Ministério Público. É só lembrar daqueles que, com salários de mais de R$ 30 mil que fazem questão de auxílio moradia, mesmo na cidade onde nasceram e sempre viveram – e daqueles juízes e ministros que mantém esse privilégio às custas do erário.
E até mesmo na Corte Suprema do país vamos encontrar candidatos ao prêmio cara-de-pau. Afinal, algumas decisões do dividido STF ficaram difíceis de explicar, como aquela que permitiu ao Senado Federal revogar medidas cautelares impostas ao senador Aécio Neves, em contraste com aquela que, pouco depois, impediu assembléias legislativas como a do Rio de fazerem o mesmo com seus acusados. Mas talvez seja melhor deixar o Supremo para ser premiado no ano que vem, depois da revisão da interpretação sobre a prisão após a segunda instância…
Não dá para parar de falar, gente, de tanta cara-de-pau em 2017. E não seria justo não falar da oposição, que quando é governo defende a reforma da Previdência e, quando não é, renega sua necessidade. E nem do Lula, do Bolsonaro, do Alckmin, e de quem mais entrar no páreo. Aliás, tem coisa mais cara-de-pau do que governo com 6% de aprovação apresetar candidato? Só os que votarem nele. Mas vamos ter muito tempo para falar deles em 2018…