Bolsonaro morde a isca e esquece de Alckmin na entrevista da Cultura

Durante sua entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, nesta segunda-feira (30), o presidenciável Jair Bolsonaro (PSL) mordeu a isca jogada por seus entrevistadores, que o manteve em seu quadrado, na extrema direita, e o fez esquecer do seu principal concorrente a uma vaga no segundo turno das eleições de outubro, o ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB+Centrão). A outra vaga, concordam até mesmo os dois candidatos, estaria reservada ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) ou ao “poste” que ele indicar, caso seja proibido de concorrer.

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Bolsonaro deixou-se encurralar pelos jornalistas convocados para a entrevista com perguntas sobre temas em que é forte junto ao eleitorado que já consolidou, mas que nada lhe acrescentam neste momento em que precisa robustecer sua vantagem sobre Alckmin. Respondendo a perguntas sobre o golpe militar de 1964, tortura, violência policial, racismo, homofobia entre outros que o levaram à liderança das pesquisas nos cenários onde não se considera a participação de Lula, o ex-capitão do Exército não pode avançar em assuntos delicados para o ex-governador de São Paulo.

Depois de ter afirmado que Alckmin juntou-se ao que de pior existe na política brasileira a ao selar o apoio do Centrão à sua candidatura, o candidato do PSL, que chegou a afirmar que o fato de ter sido amigo do ex-deputado Eduardo Cunha e filiado ao mesmo partido de Paulo Maluf  não lhe dava atestado de corrupto, poupou o ex-governador de São Paulo até mesmo das denúncias sobre desvios nas obras do Rodoanel, da ordem de R$ 600 milhões. Por um erro dos estrategistas de sua campanha, Bolsonaro preferiu medir forças com o ex-presidente Lula, de quem por mais de uma vez gabou-se de estar à frente nas pesquisas, em locais ou cenários que não chegou a identificar.

Jair Bolsonaro

O Roda Viva atingiu com a entrevista de Jair Bolsonaro a sua segunda maior audiência do ano, havendo momentos em que registrou 2,8 pontos, e perdendo apenas para a entrevista do juiz Sérgio Moro, em abril, que cravou 3,4 pontos na despedida do antigo apresentador do programa, o jornalista Augusto Nunes. Na entrevista com Geraldo Alckmin, na segunda-feira passada (23), rendeu ao Roda Viva apenas 0,4 pontos de audiência. Para medir o prejuízo de Bolsonaro ao ter poupado Alckmin, cada ponto equivale a 245,7 mil televisores ligados no Painel Nacional de Televisão e 688,2 mil telespectadores. Na Grande São Paulo, são 71.855 domicílios.

(Em entrevista ao site do UOL, em que justificou sua saída da direção do Roda Viva, Augusto Nunes denunciou que sofria pressão da direção da TV Cultura, emissora mantida pelo Governo de São Paulo, governado por Alckmin até março deste ano. “Havia uma pressão para que a gente começasse a convidar políticos amigos dos conselheiros”, disse o jornalista, acrescentando que o mesmo ocorria com relação aos jornalistas escalados para as entrevistas. “Eu deixava a escolha dos entrevistadores para a produção. Só queria jornalistas independentes, que formulassem perguntas objetivas. Mas eles [conselheiros] começaram a sugerir nomes, a fazer pressão”.)

Geraldo Alckmin

A entrevista de Augusto Nunes explica os diferentes momentos do programa Roda Viva na série de entrevistas com os presidenciáveis, como ocorreu na noite de 26 de junho com a deputada estadual Manuela D’Ávila, pré-candidata do PCdoB à Presidência da República. Na ocasião, a exemplo do que ocorreu com Bolsonaro, a parlamentar gaúcha sofreu um verdadeiro linchamento por parte dos seus entrevistadores, sendo interrompida 62 vezes no que foi impedida de apresentar suas propostas. Já a entrevista com Alckmin, apesar da baixa audiência, foi ao ar em céu de brigadeiro, com os jornalistas levantando as bolas para ele cabecear.

Além de se esquecer de Alckmin e mirar em Lula, que por enquanto não é seu adversário principal, Bolsonaro também errou na dose da única referência que durante a entrevista fez ao Nordeste, região disputada por dez entre dez presidenciáveis, não somente por ser o domicílio de 30% dos eleitores brasileiros, mas também pelo fato de Lula deter cerca de 60% da preferência desse eleitorado. Ao se colocar contra cotas para negros nas universidades em defesa de um sistema de meritocracia, Bolsonaro perguntou: “Vão pedir cota para nordestino agora?” Para corrigir seu ato falho, o ex-capitão, que enfrenta resistência do eleitorado local, poderia buscar no Nordeste um nome alinhado à sua ideologia para companheiro de chapa. Numa terra onde ainda imperam os coronéis, a tarefa não será muito difícil.

 

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