O que nessa pandemia do novo coronavírus rendeu a incondicional submissão do governo brasileiro a uma suposta parceria com a gestão de Donald Trump? O de mais concreto foi a pirataria com compras de respiradores e outros insumos básicos por estados brasileiros tomados pela mão grande dos supostos aliados americanos. Em suas performances nas entrevistas coletivas, quando em dificuldade, Trump sempre apelou para ameaças ao Brasil, como o reiterado anúncio de que pode suspender os voos entre os dois países. Isso virou um descarado recurso em seus embates com a imprensa, mesmo consciente de que a epidemia nos Estados Unidos é maior do que a brasileira, por saber que o governo Bolsonaro vergonhosamente o agasalha.
Em nova entrevista nessa terça-feira (19), Donald Trump primeiro repetiu, com mais gravame, a mesma ladainha sobre os voos do Brasil para os Estados Unidos. “Não quero que esse povo venha para cá infectar americanos”. Depois seguiu em seu roteiro de mentiras. Disse que estava ajudando o Brasil com muitos respiradores. Insinuou inclusive que seriam milhares. Se fosse verdade, seriam bem-vindos. Estão fazendo muita falta. Pelo o que até agora se sabe, é mais uma cascata. A mentira torna mesquinho até o saudável hábito dos americanos de valorizar cada dólar que doam, afinal é dinheiro do seu contribuinte.
Nessa terça-feira, foi anunciado que o governo americano doou mais US$ 3 milhões (na maluquice do nosso câmbio diário, chegou a R$ 17 milhões). É uma ajuda com a pretensão de atender a Fiocruz e a 99 municípios brasileiros em todas as fronteiras do país nessa guerra bilionária contra a pandemia. Com até mais pompa, o novo embaixador dos EUA no Brasil, Todd Chapman, anunciou no começo do mês uma ajuda para o combate ao novo coronavírus de exatos US$ 950 mil. Vendeu essa grana como uma grande ajuda.
Em qualquer conta nas várias frentes de combate a ascendente epidemia no país, não passam de merrecas. O governo americano melhor ajudaria se impedisse a pirataria contra a desesperada tentativa brasileira de comprar equipamentos essenciais ao combate do novo coronavírus.
Nem quando, logo após o golpe militar de 1964, o embaixador Juraci Magalhães pronunciou a célebre frase “o que é bom para os Estados Unidos é bom para o Brasil”, a diplomacia brasileira se submeteu tanto à americana. Sequer agora tendo a justificativa da Guerra Fria. Atropela inclusive toda a doutrina militar de soberania nacional. Um dos pilares do sucesso internacional da diplomacia brasileira foi seu profissionalismo, que virou política de Estado na gestão do chanceler Azeredo da Silveira, no governo do general Ernesto Geisel.
Agrava esse problema o fato de Bolsonaro tratar a tragédia como uma pilhéria. Ele diz que não está nem aí. E insiste na mesma aposta sem base científica: “Quem for de direita toma cloroquina, de esquerda toma Tubaína”. E a vida que siga ou não nessa roleta presidencial.
Bolsonaro continua dando seu show de insensibilidade, com o aparente propósito de exibir nesse suposto machismo uma coragem que não demonstra quando enfrenta paradas reais. Sua paranoia diante investigações, supostas ou reais, mostra uma covardia diante de qualquer ameaça a seu clã familiar.
Por causa desse receio, ele mete os pés pelas mãos e transforma seu governo em um pandemônio. Ninguém ali com alguma competência se sente seguro. Todos se sentem cada vez mais à deriva pelo piloto inseguro que perdeu o rumo. Que não sabe mais, apesar de cercado por uma penca de militares, como navegar nesse nevoeiro. Sequer consegue enxergar que o Brasil só perde com a idolatria cega e de mão única do seu clã e de seus gurus a Donald Trump.
O que ainda piora todo esse quadro é a sensação de falta de altivez dos chefes militares.
É triste assim.