Até aliados estão espantados com a sucessão de erros e trapalhadas de Dias Toffoli. Nem eles estão entendendo guinadas bruscas e inesperadas que comprometem o que parecia acordado entre eles. Ontem à noite, em conversas com interlocutores, alguns ministros do STF se diziam perplexos com o longo e confuso voto de Toffoli sobre o compartilhamento de dados pelos órgãos estatais de controle com a polícia e o ministério público.
Após quatro horas de exposição, com dois intervalos, Toffoli concluiu um voto em que sua longa narrativa parecia conflitante com a decisão anunciada. Piadas à parte, Luís Roberto Barroso chegou a sugerir a contratação de um professor de javanês para tentar traduzir o que foi dito pelo presidente do STF, Toffoli simplesmente não conseguiu esclarecer seu voto. Seu gabinete divulgou uma nota sobre a parte de ser voto referente ao Coaf que tornou a situação ainda mais confusa. Ele promete dirimir as dúvidas na abertura da sessão de hoje do Supremo.
Toffoli começou a confundir seus aliados quando, na votação sobre a possibilidade de prisão a partir da condenação em segunda instância, surpreendeu Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre, parceiros no acordão para cortar as asas de Sérgio Moro e enquadrar a Lava Jato. O que estava combinado é que o STF fecharia a porta para qualquer mudança na legislação, inclusive na Constituição, que pudesse reverter a nova jurisprudência do tribunal sobre trânsito em julgado. Além de não se alinhar à tese de que seria mexer em cláusula pétrea, Toffoli desafiou o Congresso a rever a decisão do Supremo com uma simples mudança no Código de Processo Penal.
Foi uma saia justa para Maia e Alcolumbre. Câmara e Senado disputam agora uma corrida particular sobre a paternidade da volta da punição a condenados em segunda instância. A impressão que ficou sobre o comportamento de Toffoli é que, apesar das reiteradas negativas, o objetivo era mesmo tirar Lula e José Dirceu da cadeia.
Mesmo procedimento de agora. Em julho, uma canetada de Toffoli, a pedido do senador Flávio Bolsonaro, suspendeu a investigação sobre a rachadinha organizada por Fabrício Queiroz no gabinete do 001 na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro. Para não fulanizar sua decisão, Dias Toffoli mandou suspender também todas as investigações baseadas em relatórios do Coaf, Receita Federal e Banco Central, que não tiveram autorização prévia da Justiça. Só na esfera do Ministério Público Federal quase mil investigações foram paralisadas.
O pandemônio não acabou aí. Recentes e estapafúrdias canetadas de Toffoli requisitaram dados sobre cerca de 600 mil contribuintes e os relatórios do Coaf e da Receita Federal nos últimos três anos que municiaram milhares de investigações da Polícia e no Ministério Público. A reação foi tão grande que ele teve de recuar. E mais: não teve serventia alguma em seu longuíssimo e enfadonho voto. Toffoli é responsável por toda a confusão envolvendo o Coaf ao longo do ano. Foram Toffoli e Gilmar Mendes que alertaram caciques políticos sobre o suposto risco de o Coaf ser transferido para o Ministério da Justiça sob o comando de Sérgio Moro.
Para surpresa geral, Dias Toffoli concluiu ontem que não há problema algum nos relatórios do Coaf. Constatou que eles seguem rigorosamente as leis brasileiras e os padrões internacionais. Insistiu no óbvio: nenhum órgão de informação pode pedir ao Coaf para apurar dados sobre pessoas que não estão sendo formalmente investigadas. E depois de dizer que o processo em julgamento nada tem a ver com Flávio Bolsonaro, “mais uma lenda urbana”, deixou uma brecha para beneficiar o senador, com a afirmação de o Coaf não pode repassar informações por e-mail.
Se o Coaf nada tem a ver, sobrou para a Receita para alguma deliberação de Toffoli. A expectativa era de que ele rejeitasse o pedido do Ministério Público para revogar a decisão do TRF-3 que anulou o processo pelo fato do Ministério Público ter usado dados sigilosos da Receita Federal sem prévia autorização judicial. Pois bem. Ele acatou o pedido. Disse que o procedimento foi válido. Propôs, sem explicitar se é para valer para investigações e processos anteriores, que, assim que receber os relatórios da Receita, o Ministério Público abra formalmente uma investigação e a comunique à Justiça.
O julgamento recomeça hoje, mas só deve terminar semana que vem. Interlocutores de Toffoli e de outros ministros do STF, que até ontem davam como certo um freio de arrumação nas relações entre os órgãos de controle e os órgãos de fiscalização, mudaram o prognóstico. A nova avaliação é de que Toffoli e Gilmar Mendes já não têm maioria para aprovar as restrições que há tempos vem pregando.
A conferir.