Darcy Ribeiro dizia que o Senado era melhor que o paraíso, porque não era preciso morrer para chegar lá. Ele protagonizou bons debates no Senado em um momento que o país tentava decolar e superar anos de atraso na ditadura.
O que Darcy pontuou com humor e ironia, foi levado ao pé da letra por um grupo de senadores e altos funcionários do Senado. Eles se convenceram de que estavam no Céu, podendo fazer o que bem quisessem.
Com o aval de José Sarney, Renan Calheiros, Edison Lobão, entre outros caciques, um trio de seus operadores transformou a gestão interna do Senado em clandestina. Quando a Casa caiu em 2009, com a revelação da farra em atos secretos, cafofo para variados usufrutos, e mutretas em licitações e concessão de crédito consignado, os diretores Agaciel Maia e João Carlos Zoghbi finalmente foram afastados.
O único que se segurou no cargo foi Pedro Ricardo Araújo Carvalho, o Pedrão, diretor da Polícia do Senado. Homem de confiança de Sarney e Renan, Pedrão conseguiu comprar equipamentos do mundo de espionagem de último tipo e por pilha em sua equipe com o argumento de que, no legislativo, ela tinha os mesmos poderes da Polícia Federal.
Quem vê os equipamentos da Polícia do Senado, logotipos, carros e centros de treinamentos, até os confunde com os da PF. Com essa máquina na mão, Pedrão organizou apurações paralelas de escândalos sob investigação do Ministério Público e da Polícia Federal.
Um deles, o Caso Zoghbi, é exemplar. Matheus Leitão e eu fomos fundo. A gente apurou, comprovou, obteve confissão e publicou na revista Época um escândalo com começo, meio e fim. O Ministério Público e a Polícia Federal correram atrás.
De repente, a Polícia do Senado entrou em cena. Pedro Carvalho, o Pedrão, me disse que, por ter ocorrido no âmbito do Senado, o suposto crime teria de ser apurado pela polícia legislativa. Foi a primeira vez que ouvi dizer que, por uma resolução interna, a velha Segurança do Senado havia mudado de nome e ganho poderes para, além das questões administrativas, poder fazer investigações judiciárias.
Era mais uma interpretação singular dos tempos em que o céu era o limite. Na avaliação dos investigadores da PF e do Ministério Público, Pedro Carvalho estaria agindo para proteger os senadores que bancavam João Zoghbi. Por isso, barraram a tal investigação paralela. Virou um nada.
Essa foi apenas uma escaramuça. Em vários outros episódios, procuradores da República e policiais federais se queixam de que a Polícia do Senado serve como um escudo para evitar apurações sobre negócios feitos por sua administração. E, sobretudo, para proteger senadores e seus familiares nas mais variadas investigações.
As apreensões feitas pela Polícia Federal na sexta-feira podem ser a chave para abrir mais uma caixa-preta no Senado. As geridas por Agaciel Maia e Zoghbi assombraram o país. Que segredos escondem a penca de malas e equipamentos apreendidos pela PF? Pelo que se sussurra no Senado, a expectativa é grande. A conferir.