O tropeço do STF nas próprias pernas

No afã de enquadrar a Lava Jato, o Supremo exagerou na dose, aprovou um liberou geral e ainda não sabe como sair dessa enrascada

Quem se baliza pelas avaliações e prognósticos dos ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes ficou meio confuso, na sessão do STF nessa quarta-feira, com a dispersão da suposta maioria para enquadrar a Lava Jato. O que parecia acordado, simplesmente desandou. As  interpretações e propósitos não coincidem na hora definir o que fica de pé nos inquéritos, processos e sentenças no maior escândalo de corrupção já apurado no país.

Gilmar e Toffoli, partícipes do acordão com Rodrigo Maia e Jair Bolsonaro, abençoado pelos principais caciques políticos, costuram uma delicada maioria no STF para cortar as asas de Sérgio Moro e barrar  os “excessos” da  Lava Jato e de outras investigações sobre corrupção. Sabem que só conseguem vitórias no plenário do Supremo se atraírem apoio de ministros menos engajados com essas causas como Celso de Mello e Rosa Weber.

Depois de seguidas derrotas nos últimos anos, Gilmar e Toffoli se empolgaram com recentes sucessos no tribunal, decorrentes de sucessivos desgastes da Lava Jato. Foram além: mudaram o rumo das coisas no STF com decisões monocráticas, como o inquérito sem qualquer controle a pretexto de preservar o tribunal e a suspensão de todas as investigações iniciadas com base em relatórios de órgãos estatais de controle.

Aldemir Bendine – Foto Orlando Brito

Criaram, assim, uma agenda para passo a passo reverterem os avanços da Lava Jato. Questões como prisão a partir da segunda instância, a suposta imparcialidade de Sérgio Moro, as investigações com base em relatórios do Coaf e da Receita Federal, entre outras, entrariam em pauta a partir do final de outubro. Precipitou o cronograma o surpreendente voto da ministra Cármen Lúcia na apreciação pela Segunda Turma da reclamação de Aldemir Bendine, ex-presidente da Petrobras, por não ter tido a última palavra nas razões finais de seu julgamento em Curitiba.

Ministros Cármen Lúcia, Celso de Mello e Marco Aurélio – Foto Orlando Brito

Definir a ordem da última palavra nas alegações finais de delatores e delatados de repente virou prioridade no tribunal. Passou a interessar aos que combatem e também aos defensores da Lava Jato. Já escrevi aqui sobre isso. Virou um teste para a medição de forças na briga interna no STF.

Os revezes da Lava Jato, maluquices como  a confissão de um suposta tentativa de Rodrigo Janot para assassinar Gilmar Mendes e depois se suicidar, pareciam ter aberto as portas do Supremo para um liberou geral. Nesse embalo, o plenário aprovou que as condenações dos delatados que, nas alegações finais, não se manifestaram depois dos delatores, teriam de voltar para o juizado de primeira instância. Na prática, zerava todo o esforço na justiça para a punição de corruptos em processos com delações premiadas.

Era o fim de linha para a Lava Jato em uma decisão a toque de caixa do Supremo Tribunal Federal. Até ministros que combatem as investigações se tocaram que o passo era muito grande mesmo para a perna gigante do STF. Toffoli interveio e conseguiu, com o apoio de uma eclética maioria, protelar a decisão até que apresentasse uma solução menos catastrófica do que seguir ao pé da letra a primeira opção do tribunal.

Lula na Federal de Curitiba

Empurra daqui, ajeita dali, Toffoli e Gilmar estavam certos de que resolveriam a questão  nessa quarta-feira. Só que a possibilidade de um liberou geral alimentou expectativas. Mesmo com Gilmar tendo dito a interlocutores que os critérios não tirariam Lula da cadeia, os defensores da soltura imediata de Lula se animaram. Esperavam que prevalecesse a posição do ministro Ricardo Lewandowski, favorável ao liberou geral. Davam como certa a aprovação da proposta de Alexandre de Moraes que pode anular o julgamento em primeira instância da condenação de Lula no caso do Sítio de Atibaia, seu processo mais complicado.

Na sessão do STF nessa quarta-feira, os adversários de Sérgio Moro e da Força Tarefa da Lava Jato se desentenderam. Cada um foi para um lado. Se fosse a votos como se proceder após a decisão de que, nas alegações finais, o delatado sempre fala por último, os defensores da Lava Jato, liderados pelo ministro Luis Roberto Barroso, que antes haviam sido derrotados, poderiam definir o resultado.

Na berlinda, Toffoli primeiro adiou a votação para essa quinta-feira. Tentou resolver o imbróglio nos bastidores. Não obteve sucesso. A alternativa foi incluir esse caso na pauta bombástica contra a Lava Jato que promete levar a plenário a partir do final de outubro.

A conferir.

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