A surpreendente defesa de Lula, em entrevista dez dias atrás ao UOL, das críticas de Jair Bolsonaro à imprensa foi interpretada até na militância petista como um ponto fora da curva. Alguns a justificaram, não como um gesto de boa vontade em relação ao presidente, mas pelo tamanho da bronca de Lula com a Globo e a imprensa em geral. Mas pode ter sido bem mais do que isso, uma mudança na estratégia petista para a sucessão presidencial em 2022.
Desde a derrota de Fernando Haddad no segundo turno em 2018, a ordem de Lula, então cumprindo pena em uma cela especial da Polícia Federal em Curitiba, pela condenação em duas instâncias por corrupção no caso do Tríplex do Guarujá, foi de trégua zero para Bolsonaro. Lula não quis conversa com defensores de uma postura menos radical em partidos aliados e no próprio PT.
Se mantida essa linha de ação, o que se esperava diante da resiliência de Jair Bolsonaro nas pesquisas — beneficiado por uma ainda tímida recuperação econômica e alguns bons resultados no combate à criminalidade — é que Lula e o PT subissem o tom dos ataques ao governo. Na tal entrevista ao UOL, Lula fez exatamente o contrário.
Uma nota na edição desta semana do #TAG Report, de autoria das bem informadas Helena Chagas e Lydia Medeiros, pode explicar essa súbita mudança de rumo nas hostes petistas. Contam Helena e Lydia: “Nas discussões internas do PT, Lula e seus aliados já chegaram a uma conclusão: seu principal oponente em 2022 não é Jair Bolsonaro, que, segundo essa avaliação, ainda enfrentará muito desgaste até lá. O adversário se chama Sérgio Moro”.
A definição de que Moro, e não Bolsonaro, é o adversário real a ser batido em 2022 tem impacto imediato no jogo político em Brasília. O PT e seus aliados vinham apoiando, com discrição, o acordão de outros caciques políticos, capitaneados por Rodrigo Maia e o ministro Dias Toffoli, para cortar asas de Moro e barrar avanços da Lava Jato e de outras grandes investigações sobre corrupção. O vai e vem de Bolsonaro nesse acordão é um capítulo à parte, mas até agora era um fator inibidor de uma adesão mais explícita do PT.
Se Lula efetivamente mudar o rumo de sua artilharia na sucessão presidencial, Bolsonaro vai sentir mais do que Moro. Afinal, Moro é o saco de pancada preferido dos petistas desde que seus caciques, incluindo Lula, caíram na rede de investigação do Ministério Público e da Polícia Federal sobre o maior escândalo de corrupção da nossa história. A partir da campanha presidencial, Bolsonaro se firmou como o anti-Lula e se beneficiou dessa polarização para vencer a eleição. É nela também que ele aposta suas fichas para tentar se reeleger. Só tem a perder se Lula e o PT o relegarem a adversário secundário.
A conferir.