Os cascudos estimulados pelo clã Bolsonaro nas redes sociais chateiam, incomodam, mas nem de longe são a causa maior da irritação dos líderes que cacifam Rodrigo Maia na Câmara. Eles se dizem preteridos em espaços políticos que sempre ocuparam em seus estados e em Brasília. A contragosto, assistiram a uma distribuição dos cargos nos escalões superiores por critérios que os deixaram de fora. Esperavam uma compensação em suas bases eleitorais.
Pelo menos foi o que, desde a transição, acenava o ministro Onix Lorenzoni, então responsável único pela articulação política. Ele chegou a montar uma equipe na Casa Civil com ex-deputados experientes em acertos com os colegas. A coisa começou a desandar quando entrou em cena o general Santos Cruz, amigo de Bolsonaro, para chefiar a Secretaria de Governo, tirando da Casa Civil a palavra final sobre nomeações e liberação de verbas.
A avaliação palaciana é de que, mesmo com critérios mais rígidos do que o tradicional toma lá, dá cá, os políticos continuam bem aquinhoados com verbas e indicados para cargos país afora. No burburinho dos frequentadores do gabinete de Rodrigo Maia, a versão é bem diferente. Ali, a queixa é de que, na esteira de tantos generais no primeiro escalão, militares estão sendo nomeados nos estados para postos em que os políticos sempre apitaram. O pessoal do guloso Centrão é quem mais reclama. O alvo maior é o filtro do general Santos Cruz.
Uma das formas de pressão foi condicionar o início da tramitação da PEC da Previdência ao encaminhamento do projeto relativo aos militares. Pelo andar da carruagem, os políticos previam que o sacrifício dos militares seria bem menor ( nem eles imaginavam que seria tão pouco). A pressão deu algum resultado.
Na conversa que teve com Bolsonaro no Palácio da Alvorada, Rodrigo Maia avaliou ter aberto o caminho para que os partidos fossem chamados para compor a base do governo. Em conversas reservadas, chegou a defender que os políticos reforçassem a posição de Onyx Lorenzoni, seu desafeto, para se contrapor ao general Santos da Cruz. Durou pouco.
Os sinais contraditórios do entorno de Bolsonaro geraram dúvidas antes mesmo da sequência de estresses na última semana — bate boca entre Rodrigo Maia e Sérgio Moro, tuítes agressivos de Carlos Bolsonaro e sua trupe, prisão do ex-presidente da República Michel Temer e Moreira Franco.
O próprio Bolsonaro não perde oportunidade para criticar o apetite insaciável da maioria dos partidos políticos. Em entrevista ao jornal chileno La Tercera, ele se disse envergonhado pela corrupção no Brasil ter sido maior do que em qualquer outro lugar do mundo. E fez seu diagnóstico: “Creio que a situação de Lula e Temer chegou a este ponto porque no passado buscaram a governabilidade com a compra de votos ou a entrega de estatais, de bancos, para partidos políticos. As consequências estão aí”.
Como era previsível, bombeiros estão entrando em campo para baixar a bola. Até o deputado pastor Marco Feliciano, chegado a um barraco, entrou no circuito. Pediu que Carlos Bolsonaro seja “mais comedido e controle o ímpeto juvenil” em seus posts nas redes sociais. Isso é espuma.
O que realmente vale na queda de braço entre o governo e a chamada velha política é a informação transmitida a Rodrigo Maia de que, a partir da semana que vem, Bolsonaro vai receber os partidos para conversas com o propósito de convencê-los a apoiar a reforma da Previdência.
Essa negociação, por mais que parida a fórceps, não precisa ser necessariamente espúria.
Até porque a reforma da Previdência parece ser uma exigência das principais forças de apoio ao governo e à banda do Congresso chamada para a mesa de negociação.
A conferir.