O anúncio pelo general Otávio Santana do Rêgo Barros, porta-voz da Presidência da República, da demissão por motivo de “foro íntimo” do ministro Gustavo Bebianno estava de bom tamanho para o fim de uma novela que parecia esticada além da conta. A surpresa foi não ter sido o capítulo final. Ainda tinha um vídeo para confundir ainda mais a saída de um ministro que ganhou mais relevância pela queda do que por sua real influência no governo.
No vídeo, divulgado pelo Palácio do Planalto nas redes sociais, um constrangido Jair Bolsonaro reconhece a importância de Bebianno na coordenação de sua campanha eleitoral e destaca “a seriedade e qualidade” de seu trabalho no governo. Sobre o motivo da demissão, ele desconversou: “Pode ter havido incompreensões e questões mal entendidas de parte a parte”. O que significa isso? Cadê o Bolsonaro da campanha que superou momentos difíceis dizendo na lata o que pensava?
A versão difundida pelos próprios governistas é de que o vídeo teria sido uma espécie de pedágio pago pelo presidente da República para que Gustavo Bebianno saísse do governo sem chutar o pau da barraca. O que parece confissão de alguma culpa ainda escondida. Essa interpretação ganha força pelo comportamento do clã Bolsonaro nas redes sociais, sempre ágeis em difundir as manifestações do pai. Os três filhos políticos e o próprio Jair Bolsonaro simplesmente ignoraram o vídeo e a queda de Bebianno em suas redes sociais.
Depois de cinco dias de agonia, é como se nada tivesse acontecido. Passaram uma borracha. Talvez a melhor explicação seja a da única exceção aberta pela família, divulgada no Twitter de Eduardo Bolsonaro. Ele retuitou um post publicado num tal Diário Conservador — que se apresenta como defensor de três pilares, Deus, Família e Pátria — sobre a queda de Gustavo Bebianno:
— Antes de tudo, o leitor deve saber que não há crise alguma. Apenas algumas centenas de jornalistas incompetentes que são pagos para dizer a mesma coisa e forjar um cenário fictício de desordem… A verdade é que Bebianno estava traindo o presidente desde o início, vazando informações e fofocas internas da Presidência e sabotando o governo. O “laranjal” do PSL e a tentativa de se esconder debaixo das asas de Bolsonaro foi apenas o estopim. Notícias como “os generais não querem os filhos de Bolsonaro no governo” ou outras fofocas do tipo vinham todas de Bebianno, com a finalidade óbvia de causar problemas.
No mundinho à parte dessa extemporânea cruzada puxada pela direita mundo afora, em que o clã Bolsonaro embarcou, não há espaço para divergências. Nem para supostos adversários. Por pensar um pouco diferente, contrariá-los, Bebianno virou inimigo a ser abatido, mesmo com medo de que ele possa retaliar e fazer incômodas revelações do que soube durante uma intensa parceria.
A expectativa entre militares e civis que assessoram Bolsonaro era de que ele, mesmo dando corda para “os garotos”, mantivesse controle da situação. O desempenho do presidente no Caso Bebianno decepcionou a todos. Bolsonaro se fragilizou, perdeu cacife no jogo de poder do dia a dia para aliados civis e, sobretudo, para os militares. O vice-presidente Hamilton Mourão, outro desafeto do clã, ganhou fôlego e vem nadando de braçada nessa crise política: “A questão entre o presidente e o Bebianno tem mais problemas que a mera questão das laranjas. Não sei quais são. Por isso, são questões de foro íntimo. Como eles se conhecem há algum tempo, talvez tivessem outros problemas que nunca foram ventilados”.
Quer dizer, a interrogação continua no ar.
Por não querer ou não ter respostas, além de ceder poder, o presidente precisa urgente de uma nova pauta. A melhor delas, que conta com o apoio do establishment econômico e político, é a reforma da Previdência. Se entrar de fato nessa batalha pode até ter uma trégua se a trupe familiar não atrapalhar.
A conferir.