Em tempos recentes, os políticos andavam com medo dos juízes. Quando, em meados de maio, a canetada do ministro Edison Fachin afastou Aécio Neves do Senado, esse temor virou paúra.
Menos de 15 dias depois, com receio de ser novamente atropelado pelo STF, o Senado, por unanimidade, aprovou, em segundo turno, o fim do foro privilegiado. Foi a confirmação de uma decisão surpreendente, que não refletia a opinião de grande parte dos senadores, em especial os alvos da Lava Jato e de outras investigações.
Trata-se de uma emenda constitucional que acaba com o foro privilegiado, exceto para os presidentes dos três poderes da República, para as autoridades em todos os níveis que forem acusadas de crime comum, como corrupção e lavagem de dinheiro.
A votação ocorreu na véspera da sessão do STF na quinta (1) de junho que julgaria uma proposta para restringir o foro privilegiado, bem menos ousada. Os senadores sabiam que a tendência no Supremo era de lhes cortar mais uma asinha.
Três ministros declararam apoio ao voto do relator Luís Roberto Barroso para que quem pratique crime sem ter a ver com exercício do mandato seja julgado em primeira instância. Ou seja, no caso da Lava Jato, por Sérgio Moro e outros juízes federais.
A sensação de que a casa desabou durou pouco. No dia 9 de junho, Gilmar Mendes desdisse praticamente tudo o que disse durante todo o processo e deu o voto de minerva no Tribunal Superior Eleitoral contra a cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer.
Vinte dias depois, uma canetada do ministro Marco Aurélio Mello devolveu o mandato a Aécio Neves. Aí, os políticos passaram a peitar abertamente os juízes e os ministros do próprio STF.
O corolário desse processo foi a amarelada de Cármen Lúcia, que cedeu à pressão dos políticos, e transferiu para a Câmara e o Senado a palavra final sobre punição a deputados e senadores. Escancarou ali uma porteira para, Brasil afora, políticos livrarem colegas flagrados em escândalos de corrupção. Farra geral.
Pois bem. Como no velho e bom slogan de uma empresa de transportes, o mundo gira e a Lusitana roda: o foro privilegiado volta esta semana à pauta da Câmara e do STF.
Pela agenda legislativa, pode ser votado hoje na Comissão de Constituição e Justiça. Nem a Velhinha de Taubaté, a crédula personagem de Luís Fernando Veríssimo, acreditaria que os políticos aprovem esse suicídio coletivo.
Pelo contrário, eles querem é mais impunidade. São várias ameaças de mudar leis para reverter decisões do Supremo do tempo em que todos, com base na Constituição, acreditavam que competia ao STF dar a última palavra.
Ali, eles estão tranquilos, apostam que tiram de letra.
Talvez tenha mais dificuldade em outra parada. Cármen Lúcia pautou para essa quinta-feira (25) a retomada do julgamento pelo STF do foro privilegiado. Depois da surra que levaram nas redes sociais, alguns ministros entendem que essa é uma boa oportunidade para começar a reverter o filme queimado.
Outros não estão nem aí. Há dúvida se, por problema de saúde, Ricardo Lewandowski poderá participar da sessão. Sua ausência pode ser um pretexto. Os que estão satisfeitos com o avanço de providências para baixar a crista da Lava Jato já falam em adiar, mais uma vez a decisão sobre o foro privilegiado.
A conferir.