A ofensiva no STF para dar um tranco na Lava Jato e em outras investigações sobre corrupção continua a tropeçar em suas próprias decisões. A carta tirada da cartola de alguns ministros de que, nas alegações finais em primeira instância, os réus delatados teriam que falar sempre depois dos réus delatores, caiu em buraco negro no próprio tribunal. Ali se jogou para a frente, por um tempo indeterminado, como e quando definir as regras a aplicar a um universo de decisões que eles sequer sabem quais são.
Numa exemplar reação a esse barata voa de regras aprovadas pelo STF com conclusão sine die, o procurador regional da República Maurício Gerum, que atua nos casos da Lava Jato em segunda instância no TRF-4, acatou a decisão do Supremo e propôs a anulação da condenação de Lula e todos seus supostos cúmplices no caso do Sítio de Atibaia. O tribunal já marcou o julgamento desse requerimento para o dia 30 de outubro. É uma mostra de agilidade da Justiça Federal sem se intimidar com o jogo de filigranas que enriquece advogados e tanto sucesso faz nos tribunais em Brasília.
Até lá, o STF não terá desfeito o nó criado com essa nova interpretação sobre o prazo nas alegações finais para réus delatores e delatados e nem concluído outro julgamento que também afeta diretamente a Lula. Com todos cuidados, pompas e algumas circunstâncias, a pauta do Supremo é sobre em que etapa da condenação criminosos podem começar a cumprir a pena.
No primeiro dia efetivo de julgamento, nessa quarta-feira (23), como esperado, até foram expostos argumentos jurídicos pelos quatro ministros que votaram, dando uma maioria provisória de três a um a favor da prisão a partir de condenações em segundo grau. A expectativa nessa quinta-feira é sobre o voto da ministra Rosa Weber. A maioria das apostas é de que ela acompanhará o relator Marco Aurélio Mello levando a um placar de cinco a cinco — Cármen Lúcia e Luiz Fux de um lado e Gilmar Mendes e Celso de Mello de outro – com o voto de minerva do presidente Dias Toffoli.
O desfecho desse julgamento também será adiado. A previsão é de que nada se decida em definitivo no STF antes que suas questões mais polêmicas estejam postas na mesa. O que se busca no tribunal não é mais a vitória de nenhum dos lados. É a construção de alguns consensos que mantenham um mínimo de unidade no tribunal.
Esse novo julgamento, várias vezes adiado, até aqui vem sendo marcado por uma sucessão de sinais. Começou com o decano Celso de Mello marcando terreno em defesa das posições do tribunal, com o apoio até de quem tem discordância, e seguiu adiante com o critério de tempo e espaço abertos para as posições relevantes.
Nessa quarta-feira, o palco foi para o ministro Luís Roberto Barroso. Ele fez o dever de casa e deu um show com a exibição de dados oficiais sobre o descalabro de quem está na cadeia no Brasil. A grande maioria está presa sem passar por instância alguma. Para essas centenas de milhares no xadrez, a discussão sobre em que instância pode ir para a cadeia nem parece lote na Lua, mas em Marte.
Em seu voto, com números e dados oficiais, Barroso desmontou outra alegação propagada pela turma que fatura com a indústria de recursos. Os principais advogados da galera de colarinho branco insistem que ampliar a possibilidade de recursos gera benefício também para os mais pobres. Barroso comprovou, com informações do STJ e do STF, que isso é uma cascata. Só quem banca recursos infindáveis são os poderosos com seus advogados de sempre. É o chamado jogo jogado.
Mas o julgamento sobre a prisão em segunda instância continua nessa quinta-feira. O palco está armado para a ministra Rosa Weber, cujo voto mais uma vez é tido como decisivo. As apostas é de que, dessa vez, finalmente vote com sua declarada posição contra a prisão em segundo grau. Se mais uma vez surpreender, ela simplesmente liquida a fatura. Caso contrário, o que parece mais previsível, joga a bola para Dias Toffoli.
Essa é a grande aposta no tribunal. Uma alternativa proposta por Toffoli que não tira Lula da cadeia, dá um fôlego para quem já foi condenado em segunda instância, e uma esperança para quem estiver na fila da primeira instância.
Por esse jogo, Lula deixa de ser um problema para o plenário do STF, com julgamentos sob todos os holofotes televisivos, e vira uma questão a ser decidida na Segunda Turma quando Gilmar Mendes sentir que dá para resolver.
A conferir.