Maluf e Fujimori usam as mesmas armas para escaparem da Justiça

Deputado Paulo Maluf. Foto Orlando Brito

Em culturas como a nossa, Natal é tempo de perdão. Daí o costume de graças, indulgências e de indultos em sociedades ditas cristãs para quem fez por merecer ou já pagou parte dos pecados que lhe foram imputados.

Mesmo por essa perspectiva, esse é um Natal diferenciado na América do Sul. Quem primeiro chutou a bola foi Michel Temer, ao ignorar sugestões dos órgãos competentes, e escancarar, em decreto publicado na sexta-feira (22), brechas para beneficiar corruptos.

Bateu de frente com a ojeriza à roubalheira generalizada no país. “O indulto materializa o comportamento de que o crime compensa”, cravou a procuradora Raquel Dodge, com a suavidade e a firmeza habituais, em seu pedido ao Supremo Tribunal Federal para a suspensão imediata do tal indulto.

No mesmo dia desse agrado de Temer aos enrolados na Lava Jato e em outras investigações, Pedro Paulo Kuczynski, o PPK, presidente do Peru, enfrentava um impeachment no parlamento peruano.

Escapou com a mãozinha de uma parte dos aliados do ex-presidente Alberto Fujimori, que mofava na cadeia.

Dois dias depois, PPK assinou um “indulto humanitário” que abreviou em 15 anos a pena de Fujimori por corrupção e violações aos direitos humanos.

Como a canetada de Temer, criticada aqui e mundo afora, o indulto a Fujimori causou rebuliço dentro e fora do Peru.

O ex presidente Fujimori na Unidade de Cuidados Intensivos de Lima com o filho Kenji. Reprodução FaceBook de Kenji

O indulto, segundo PPK, foi decorrente de um diagnóstico médico que atestou que Fujimori, de 79 anos, sofria de “problemas incuráveis e degenerativos”.

Porteira aberta, os defensores de Abimael Guzmán, 83 anos, líder do Sendero Luminoso, o tresloucado movimento armado que aterrorizou o Peru, tentam pegar carona para reverter sua condenação à prisão perpétua. Alegam uma penca de problemas de saúde, como hipertensão e depressão, para também conseguirem um indulto.

No Brasil, o protagonista nessa berlinda é Paulo Maluf. Bons advogados e brechas legais arrastaram sua punição por tempos infindáveis. Por todas essas delongas, ele virou símbolo mor da impunidade no país.

Mas, às vésperas do Natal, Maluf virou inquilino do presídio da Papuda, em Brasília, pavor de boa parte das elites políticas de todos os naipes.

Maluf, 86 anos, sofre de problemas na coluna e há tempos se trata de um câncer na próstata, entre outras complicações menos graves, algumas típicas da idade. Esse é um resumo leigo do atestado do Instituto Médico Legal de Brasília, com base na avaliação de seus médicos e de informações recebidas do Hospital Sírio Libanês, referência internacional.

A defesa de Maluf contesta. O advogado Antônio Carlos Almeida Castro, o Kakay, afirma que essa avaliação é incompleta. Seria, por exemplo, superficial em relação aos problemas cardíacos de Maluf. Diz que só um exame presencial por um médico indicado pela defesa dirimiria as dúvidas.

O advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay. Foto Orlando Brito

Kakay indicou Sami El Jundi, médico e perito criminal, de Taquara, município gaúcho. Justifica a escolha: “Ele atuou bem em outros casos. Criticar o fato de ele morar no interior do Rio Grande do Sul é preconceito”.

O juiz Bruno Macacari, da Vara de Execuções Penais, responsável pela definição do endereço de Maluf na virada do ano, estranhou essa escolha. Atribuiu a ela nos autos o fato de Samir não ter chegado a tempo de acompanhar a avaliação de Maluf no Instituto Médico Legal.

O duelo entre acusação e defesa, tendo o juiz como árbitro, mesmo que às vezes contestado, faz parte do jogo. É assim que se espera que a Justiça funcione.

A questão é como tratar com esses fantasmas do passado.

O que fazer, por exemplo, com Maluf e Fujimori.

Devem ser absolvidos pelas agruras da idade ou pagarem pelos crimes que cometeram.

Esse suposto dilema é o apego derradeiro de quem não tem mais argumentos para defender o indefensável.

É o fim da linha.

 

 

 

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