A arrogância e o desespero costumam ser maus conselheiros políticos. Jair Bolsonaro fez sucesso ao bater na tecla que Lula, mesmo se achando o rei da cocada preta, não era o dono do Brasil. Foi assim que Bolsonaro se diferenciou dos tucanos e de outros adversários do PT que evitavam um confronto direto com Lula.
Mesmo preso por corrupção em Curitiba, Lula ainda aparecia como favorito nas pequisas eleitorais. Isso estimulou o PT a arriscada aposta de concorrer com um candidato, Fernando Haddad, como uma espécie de regra três. A campanha de Geraldo Alckmin, dona de um latifúndio de tempo na propaganda eleitoral no rádio e na TV, batia em Bolsonaro, criticava o PT, mas aliviava para Lula. Ciro Gomes e Marina Silva também criticavam o PT mas, na expectativa de herdarem votos lulistas, também pouparam Lula.
Deixaram para Bolsonaro a exclusividade de expor a narrativa, descrita em inquéritos e processos pelos investigadores da Lava Jato, de que Lula chefiou uma quadrilha no maior assalto aos cofres públicos no Brasil e no mundo inteiro. Lula sempre reagiu a essas acusações se apresentando como vítima de uma conspiração por ter melhorado a vida dos mais pobres. Lula continua insistindo nessa versão. Na carta que divulgou nessa semana, ele afirmou que, se não estivesse injustamente preso, venceria as eleições no primeiro turno. Para ele, pouco importa se essa tosca versão ajuda ou prejudica Haddad.
Mesmo antes de ir para a cadeia, Lula se apegou a fantasias como ser um novo Nelson Mandela — um herói de verdade — a ser resgatado pelo povo. Com toda essa megalomania, ele encolheu durante a campanha eleitoral. A conta sobrou para Haddad, que perdeu tempo buscando sem sucesso apoios que Lula afastou.
Nesse jogo que parecia jogado, Haddad acabou recebendo uma ajuda inesperada de Jair Bolsonaro. Evidente que as bobagens e basófias dos filhos causaram um desgaste, reduzidos pelos corretivos do pai. Mas o que pesou mesmo foi o discurso do próprio Bolsonaro, transmitido ao vivo para sua militância na Avenida Paulista, em que com arrogância fez ameaças a adversários, a imprensa e ao escambau e se apresentou como o novo dono do país.
Como assim? Quem fez campanha dizendo que o Brasil não tinha dono de repente se apresenta como candidato ao posto? Trombou com um dos carros-chefes de sua campanha eleitoral.
As pesquisas eleitorais dessa semana constataram isso. A do Ibope ligou o alerta e a da Datafolha mostrou o cartão amarelo. Advertiram Bolsonaro de que o verdadeiro recado das urnas é de que o Brasil não aceita dono. Não importa o lado.
Bolsonaro ainda mantém ampla diferença de votos. Ele tem dado sinais de que pisou no freio das bobagens que vinha propagando. A dificuldade para Haddad é que essa insatisfação com Bolsonaro não se traduz em sua aprovação, com rejeição ainda bem alta, alavancada pelos que não querem a volta de Lula para dar ordens no terreiro.
A conferir.