Nada como o medo para estimular apelos aos deuses. São nessas horas que arrogantes, supostos valentes, acabam baixando o tom, com vozes menos ruidosas e até mais finas. No auge de seus supostos poderes eles se autoavaliam com indulgência, chegam a se atribuírem qualidades divinas.
Foi assim que Frederich Wassef um medíocre bacharel em direito, operador em áreas cinzentas como delegacias de polícia para escritórios de advogados de verdade, usou essa sua especialidade que pouco tem a ver com o Direito para ganhar a admiração da família Bolsonaro e o apelido de “Anjo”. Conseguiu esse status com dois feitos. Primeiro fez sumir Fabrício Queiroz, o calcanhar de Aquiles do clã Bolsonaro nos escândalos da Rachadinha e das milícias, seus principais pecados no passado. Usou suas casas em São Paulo, Santos e Atibaia.
Depois ao assinar uma petição aceita no recesso do Judiciário pelo ministro Dias Toffoli, que suspendeu as investigações sobre o primogênito Flávio Bolsonaro, ele ganhou direito a desfilar em público como o advogado da família. Vaidoso, estava incomodado em receber apenas nos bastidores o reconhecimento por manter Fabrício Queiroz sob controle.
A casa caiu. Todo o script também. Aquela peça que alimentava a militância e dava discurso contra a oposição caducou. De entrevista em entrevista, Fred Wassef expõe cada vez mais o ridículo da encenação que montou para a família presidencial. Nada ficou de pé.
Hora de novo espetáculo. Quem tem um mínimo de discernimento no entorno de Bolsonaro cruzou duas informações públicas e uma de bastidores e chegou a uma conclusão óbvia. O modelo da aposta em uma militância raivosa, física ou por robôs, para tentar acuar outros poderes deu errado. Primeiro o STF começou a agir e a linha de frente dessa turma caiu na rede. Perdeu sua eficácia. E assustou outros apoiadores.
A suposta retaguarda desses movimentos erráticos perdeu significado na leitura mais acurada das pesquisas confiáveis de opinião pública. O apoio a essas maluquices vem caindo de pesquisa a pesquisa. Cada vez mais os brasileiros apoiam a manutenção da democracia. Lorotas como a tal intervenção militar são cada vez mais rejeitadas. Os comandantes militares sabem disso e deram uma trava interna nessa narrativa. A trava externa veio das pesquisas. Vários dados da pesquisa do Datafolha, por exemplo, mostram esse encolhimento do apoio ao radicalismo.
O que mantém o apoio a Bolsonaro em cerca de um terço da população são os beneficiários das ajudas emergenciais na pandemia que não eram eleitores dele. Isso mostrou a necessidade de investir em uma nova base. Como no populismo de esquerda de Lula, ele está aprendendo que distribuir dinheiro para quem necessita agrada aos beneficiários, movimenta a economia e muitas vezes faz justiça.
O que dá sentido a essa guinada no alvo popular para a busca de novos apoios é o movimento das principais peças do governo para uma mudança no trato com os outros poderes. Bolsonaro tem se empenhado até agora em fazer essa dever de casa. Através de ministros ou pessoalmente trocou as hostilidades a ministros do STF e aos líderes no Congresso por uma série de gestos amistosos, e até algumas bajulações.
Nessa segunda-feira (29) sancionou a Lei Aldir Blanc, um projeto apresentado pelas oposições que destina R$ 3 bilhões para atender trabalhadores e setores culturais à míngua por seu público estar de quarentena. Isso é apenas um exemplo de mudanças de comportamento depois da queda do Anjo e da prisão de Queiroz. Além de abrir o governo para a participação do Centrão, um grande grupo parlamentar sempre à disposição no balcão, tem feito acenos para ministros do STF e a outros setores que antes eram alvos de agressão.
A dúvida é sobre a duração desse novo papel de Bolsonaro paz e amor. As investigações vão prosseguir. Não há mais como proteger Fabrício Queiroz. Todo o passado do clã Bolsonaro virá a tona. De nada adiantou pressões sobre Sérgio Moro e a Polícia Federal em busca de uma proteção para esse pavor do próprio passado. São tantas apurações em diversos níveis da polícia e do ministério público que insistir em em controlá-las é tiro no pé.
A conferir.