Em novembro do ano passado, o Coaf meio que caiu no colo de Sérgio Moro durante a conversa com Jair Bolsonaro em que aceitou o convite para ser ministro da Justiça e da Segurança Pública. Moro sabia da relevância do Coaf, e do seu papel no combate à corrupção e ao crime organizado. O presidente eleito não fazia a menor ideia do significado daquelas quatro letrinhas. Saiu dali o aval para que o órgão migrasse do Ministério da Economia para a Justiça. Bolsonaro começou a se arrepender um mês depois.
Em plena lua de mel eleitoral, Bolsonaro tomou um susto antes de sua posse quando se tornou público um relatório do Coaf que mostrava uma movimentação atípica nas contas de Fabrício Queiroz — seu amigo e assessor do filho Flávio Bolsonaro. Foi o pontapé inicial de um escândalo que até hoje assombra o clã Bolsonaro. Mesmo assim, ele manteve o compromisso de transferir o Coaf para a Justiça e nomear para sua presidência o auditor fiscal Roberto Leonel, representante da Receita Federal na Força Tarefa da Lava Jato em Curitiba.
O establishment político em Brasília recebeu a chegada de Sérgio Moro com todos os pés atrás. Em conversas com caciques políticos, os ministros do STF Gilmar Mendes e Dias Toffoli alertaram que, se as asas de Moro não fossem cortadas, a Lava Jato faria uma terra arrasada nos poderes da República. Em uma dessas conversas, patrocinada por Rodrigo Maia, foi acertado que a reação começaria com a retirada do Coaf do comando de Moro. O maior receio era de que Jair Bolsonaro fizesse disso uma queda de braço.
Qual não foi a surpresa quando, em meados de abril, o presidente não só deu sinal verde para tirar o Coaf de Moro como confessou ter aceitado a troca do órgão sem ter a menor noção da sua importância. Começou aí a costura com Toffoli e Rodrigo Maia que resultou no acordão que por muito pouco não causou a demissão de Sérgio Moro e um retrocesso irreparável na Lava Jato e em outras investigações sobre corrupção de colarinho branco.
Sob a batuta de Rodrigo Maia, em maio, o Centrão e o PT venceram na Câmara a batalha pela volta do Coaf para o Ministério da Economia na Câmara e manobram para que ela não fosse revertida pelo Senado. Um mês depois, o site The Intercept começou a série sobre “as mensagens secretas da Lava Jato”, fazendo um escândalo com conversas banais entre investigadores e em todas instâncias da Justiça. Foi o suficiente para pôr Moro no pelourinho.
Logo que o STF entrou em seu recesso de julho, Dias Toffoli pôs a cereja no bolo comemorativo do sucesso do acordão. Aproveitou um pedido da defesa de Flávio Bolsonaro e, numa canetada sem precedentes e sem medir as consequências, suspendeu o inquérito sobre o filho do presidente e mais de mil investigações, baseadas em relatórios do Coaf e da Receita Federal, sobre corrupção e crime organizado. O STF acabou corrigindo esse absurdo, inclusive com o voto do próprio Toffoli, que sequer pediu desculpas pelo prejuízo que causou.
Em agosto, Bolsonaro fingiu ressuscitar o Coaf. Em medida provisória, o rebatizou de Unidade de Investigação Financeira, o transferiu para o Banco Central e abriu as portas para que fossem nomeadas para o conselho pessoas de fora do serviço público. Na noite dessa quarta-feira (11), foi justamente a Câmara dos Deputados que fez as correções. Restabeleceu o nome Coaf, e, mais importante, a exigência de que seus integrantes façam parte de carreiras de estado. Mudanças que na próxima semana serão referendadas pelo Senado. Noves fora todas as bobagens, o Coaf voltou a ficar com o tamanho de sempre.
Na montanha russa que tiveram de encarar em Brasília, Sérgio Moro e a Lava Jato encerram o ano no topo. E com muito mais traquejo para enfrentar os adversários de sempre, forçados a recuar na luta em favor da impunidade, mas que não desistiram.
A conferir.