Mais até que as empresas estatais, os bancos públicos sempre resistiram à exposição de desvios, fraudes e outras grandes maracutaias em suas operações financeiras. Obrigação legal com o sigilo bancário, desgaste de imagem na disputa com concorrente privados, munição para quem acabar com os bancos públicos, tudo servia para justificar a cultura segredista.
Nessa segunda-feira (7), Jair Bolsonaro e o ministro Paulo Guedes aproveitaram a solenidade no Palácio do Planalto para empossar os novos presidentes de bancos públicos para anunciar, com pompa e circunstância, a abertura das caixa-pretas no BNDES, Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil e Banco do Nordeste.
Numa pegada bem diferente dos discursos habituais dos ministros que comandam a economia, Paulo Guedes disse que os bancos públicos foram alvos da pilhagem de uma associação entre “piratas privados, burocratas corruptos e criaturas do pântano político”. Prometeu novidades com a abertura em breve da caixa-preta da Caixa Econômica, “vítima de saques e fraudes”.
Criou a expectativa de que vá além das avançadas investigações do Ministério Público e da Polícia Federal, a partir da Lava Jato, que já desvendaram esquemas como o do MDB, comandados pelos ex-deputados Eduardo Cunha e Geddel Vieira Lima. Outros partidos, como o PT e o PP, também participaram da farra na Caixa Econômica. O doleiro Lúcio Funaro e outros operadores já deram os caminhos da pedra de grandes negociatas.
Nessa mesma segunda-feira, o ex-ministro Antonio Palocci, que já mandou e desmandou na CEF, prestou um longo depoimento aos procuradores da República em Brasília que, na Operação Greenfield, apuram fraudes nos fundos de pensão e na Caixa Econômica. Em uma delas, por sinal, o próprio Paulo Guedes está sendo investigado. Ele nega.
Uma penca de escândalos já ocorreram no Banco do Nordeste, com suas cobiçadas diretorias sempre loteadas entre os partidos governistas. O Banco do Brasil, mesmo quando apura e pune desvios, não gosta de sua exposição pública. A contragosto, foi um dos protagonistas no escândalo do Mensalão. Foi incluído por Paulo Guedes entre os bancos públicos a terem a caixa-preta aberta. A conferir.
O BNDES é um caso singular. Auditores do Tribunal de Contas da União e procuradores da República há tempos avaliam que a abertura da caixa-preta do BNDES vai revelar um rombo maior que o da Petrobras. Técnicos do banco dizem que isso é uma fantasia. Argumentam que, na gestão de Maria Sílvia Bastos Marques, todas as informações requeridas pelos investigadores do MP e do TCU foram repassadas.
Ainda assim, persiste forte desconfiança de que nem tudo foi revelado. Os investigadores querem saber mais. Inclusive o que ainda se mantem fechado sob a alegação de sigilo bancário. Ao aceitar a indicação de Joaquim Levy para a presidência do BNDES, Jair Bolsonaro cobrou a abertura incondicional de informações — inclusive todos os detalhes dos contratos nos polêmicos financiamentos para países da África, Cuba e Venezuela.
Tão relevante quanto apurar e tornar pública toda e qualquer falcatrua do passado é mudar a cultura do segredo nos bancos, empresas estatais e repartições públicas. A publicidade sobre o uso do dinheiro público tem que ser a regra em toda a administração. Sem necessidade, inclusive, de se ter de recorrer o tempo todo à Lei de Acesso à Informação.
Além da promessa de abrir as tais caixas-pretas, outra boa intenção em nome do governo foi anunciada pelo General Santos Cruz, chefe da Secretaria de Governo da Presidência da República: “A maneira mais eficaz de se combater a corrupção, além das medidas de gestão, do uso de tecnologia no controle de gastos públicos, é a divulgação, é a publicidade. Tem que divulgar tudo o máximo que puder”. E acrescentou que tem que abrir para a imprensa: “Eu não tenho medo dessa exposição, todo mundo aqui vai estar exposto a todas as avaliações e informações que devem ser divulgadas”.
Tomara que essas sejam as regras de um novo jogo. Tão importante como abrir as caixas-pretas espalhadas pelas administrações em todos os níveis, em todos os poderes, país afora, é criar mecanismos para evitar a proliferação de outros nichos de corrupção que se transformem em novas caixas-pretas. A transparência, se cumprida, facilitará o trabalho dos investigadores, da equipe do ministro Sérgio Moro, e da imprensa em fiscalizar a aplicação do dinheiro público.
A conferir.