Bolsonaro costuma fazer apostas arriscadas no instável humor das arquibancadas de futebol. Em dezembro, recém-eleito, com popularidade em alta, ele chegou a entregar a taça do Brasileirão ao Palmeiras, no estádio Allianz Parque, em São Paulo. Foi aplaudido, tomou gosto. Mesmo vindo perdendo, pesquisa a pesquisa, apoio popular, continuou a ir a estádios, onde a recepção já não lhe é tão favorável.
Na última terça-feira, durante a semifinal entre Brasil e Argentina, no intervalo do jogo, ele desfilou em torno do gramado do Mineirão. Recebeu aplausos e vaias maiores do que esperava. Mas não deu o braço a torcer. Anunciou a ida à final da Copa América no Maracanã, palco de famosas saias justas presidenciais. Em 2007, por exemplo, o então presidente Lula, irritado com as vaias, quebrou o protocolo e não fez a declaração oficial de abertura dos Jogos Panamericanos.
Depois de ter sido hostilizada na abertura da Copa do Mundo no Itaquerão, Dilma Rosseff pagou outro mico no Maracanã quando a Alemanha se tornou campeã mundial. Na época, às vésperas das eleições presidenciais, o PT atribuiu as seguidas vaias à “elite branca”, a única que tinha dinheiro para comprar ingressos tão caros. Dois anos depois, Michel Temer tentou fingir de morto mas também não escapou de sonora vaia na abertura dos Jogos Olímpicos.
Agora, Bolsonaro está em busca de companhias para seu teste no Maracanã. Ele convidou Rodrigo Maia, político do Rio, para acompanhá-lo nesse domingo na final da Copa América entre Brasil e Peru. Maia caiu fora. Justificou a recusa em entrevista à rádio Jovem Pan: “O Maracanã vaia até minuto de silêncio. Vou ficar em Brasília trabalhando a reforma da Previdência”. Essa frase sobre o comportamento irreverente do Maracanã é atribuída a Nelson Rodrigues em um crônica, em 1970, sobre os aplausos ao ditador Garrastazu Médici no jogo entre o São Paulo e o Porto na inauguração oficial do estádio do Morumbi. “No Estádio Mário Filho, ex-Maracanã, vaia-se até minuto de silêncio e, como dizia o outro, até mulher nua”, escreveu Nelson Rodrigues.
Há outra versão sobre a origem dessa fama do Maracanã. Segundo o professor Roberto Romano, da Unicamp, tudo começou com a reação da torcida, em julho de 1967, quando os alto-falantes do estádio anunciaram a morte do general Castelo Branco, primeiro presidente da ditadura de 64, em um desastre aéreo.
Alguns presidentes tiraram as vaias, em grandes concentrações públicas, de letra. Em 1954, nas comemorações do quarto centenário da capital paulista, no Jockey Club de São Paulo, Getúlio Vargas foi alvo de uma grande vaia. Consta que não perdeu a pose. Teria cochichado com Tancredo Neves, então ministro da Justiça: “Não sabia que o Garcez era tão impopular”, referindo-se ao governador de São Paulo, Lucas Nogueira Garcez, que estava a seu lado.
Uberaba sempre foi a capital do zebu. Em uma de suas visitas, Fernando Henrique foi recebido lá com vaias. Seu anfitrião, o governador Hélio Garcia, saiu-se com essa: “Em Uberaba, os meninos vaiam até boi premiado”.
Nessa sexta-feira, Jair Bolsonaro resolveu dobrar sua aposta na ida ao Maracanã. Anunciou que vai levar o ministro Sérgio Moro, alvo de uma avalanche de controvertidas mensagens divulgadas pelo site The Intercept e seus parceiros na imprensa. “Pretendo domingo não só assistir à final do Brasil com o Peru, bem como, se for possível, se a segurança permitir, irei com Sérgio Moro junto ao gramado. O povo vai dizer se estamos certos ou não”.
A intenção de Bolsonaro parece ser mesmo de prestigiar Moro. Mas, segundo as pesquisas, a popularidade de seu ministro da Justiça, mesmo sob ataques dos variados adversários da Lava Jato, ainda é maior que a de Bolsonaro — domingo passado, manifestantes foram às ruas em dezenas de cidade em expressivos atos de apoio a Moro. É, portanto, uma companhia que o ajuda no teste popular. Mas, se o Maracanã mantiver sua tradição, e receber o presidente e sua comitiva com uma sonora vaia? A exemplo de Getúlio Vargas, Bolsonaro sempre pode tentar terceirizar a vaia, dizer que foi Sérgio Moro quem não passou no teste.
A conferir.