Era o tipo de festa que até recentemente o presidente Jair Bolsonaro não faltaria de jeito nenhum. Foi o concorrido lançamento na quarta-feira (4) do Instituto General Villas Bôas, uma entidade para preservar a memória do militar e ajudar pessoas com doenças raras, crônicas e com deficiência. Estavam lá assessores do presidente, como os ministros Sérgio Moro e Augusto Heleno, o porta-voz Otávio Rêgo Barros, e uma penca de generais para prestigiar Villas Bôas, tido por eles e pelo próprio Bolsonaro como referência por sua conduta como chefe militar.
A ausência de Bolsonaro talvez se explique pela escolha dos principais oradores — o apresentador Luciano Huck, possível concorrente nas eleições de 2022, e o general Eduardo Rocha Paiva, um dos principais auxiliares de Villas Bôas na criação do instituto, notório desafeto de Bolsonaro. Paiva censurou a famosa gafe de Bolsonaro ao se referir aos nordestinos como “os paraíba”, que definiu como “grosseira e antipatriótica” e foi chamado pelo presidente de general melancia, verde por fora e vermelho por dentro.
A pretexto de alertar o general Villas Bôas das dificuldades enfrentadas hoje em dia pelas ONGs sérias e comprometidas com o Brasil, Luciano Huck deu a primeira estocada em Bolsonaro: “O terceiro setor, que é o mundo das ONGs, tem sofrido ataques desleais nos últimos tempos no Brasil”. Todos entenderam que o alvo foi o presidente e sua família com disparates como culpar as ONGs que atuam na Amazônia pelo aumento das queimadas na região e atribuir ao GreenPeace o vazamento de petróleo que atingiu as praias do Nordeste.
Se o cascudo de Huck teria incomodado Bolsonaro, certamente o discurso do general Rocha Paiva o teria tirado do sério. “Um projeto de Nação precisa de uma sociedade disposta a superar o quadro de corrupção, impunidade, e a lógica da predominância do conflito sobre o debate respeitoso de ideias. A virtude está no centro. Os extremos são viciosos… Será preciso cicatrizar a ferida aberta que compromete a coesão interna, fruto do embate ideológico com sua injustificável intolerância ao contraditório nos temas e debates políticos e na administração de setores importantes da sociedade”.
O alvo é claro — a recusa da polarização que Bolsonaro e Lula cultivam como projeto político. Vários setores da sociedade têm se manifestado com críticas semelhantes. O que torna mais relevante o discurso do general Rocha Paiva é ele ter sido proferido em um ambiente que, por cargos e patentes, deveria ser amplamente favorável a Bolsonaro. Isso parece explicar a ausência de Bolsonaro na festa.
A conferir.