Os juízes não só empurraram um aumento de seus salários e também de promotores goela abaixo da opinião pública como querem emplacar a versão de que ele é justo e necessário e não causará rombo algum nas contas públicas. Os ministros do STF Ricardo Lewandowski e Luiz Fux não se cansam de repetir que o reajuste de 16,38% é modesto, porque nas contas deles a defasagem salarial é de 41%.
Os argumentos de Dias Toffoli, presidente do STF, são ainda mais espantosos. Em um evento na noite dessa segunda-feira (26), promovido pelo site Poder 360, ele escancarou a pressão dos juízes com todas as letras: “Não adianta querer enfrentar a realidade. A realidade está aí: Se cai o auxílio-moradia e não tem subsídio, a magistratura para. Para, acabou. Quem é que vai pôr as pessoas na cadeia? Elas vão se auto-pôr na cadeia. Todo poder tem muito poder”.
Como assim, os juízes podem fazer greve? Se eles têm o poder de mandar prender, são outras corporações, como as variadas polícias, que cumprem as ordens e executam as prisões. As polícias civil, militar, rodoviária, federal e todas as outras o tempo inteiro reivindicam aumentos salariais com a mesma justificativa de que seus vencimentos estão defasados. Elas também têm muito poder. Devem seguir o exemplo dos juízes e ameaçar cruzar os braços, não prendendo mais ninguém?
Depois que Michel Temer sancionou o reajuste salarial, o ministro Luiz Fux revogou sua liminar que, há quatro anos, estendeu o pagamento do auxílio-moradia aos juízes de todo o País, mesmo os que moram em casa própria. Mas a revogação só entra em vigor quando juízes e procuradores receberem os contracheques com os novos salários. Mas nem é isso absolutamente garantido. Algumas associações de juízes já anunciam que vão lutar para acumular o reajuste salarial com o auxílio-moradia atualmente no valor de R$ 4,3 mil.
Na ótica de Toffoli e de outros colegas dele no STF, o reajuste resgatou a dignidade da Magistratura e do Ministério Público. Mas o próprio Toffoli reconhece que o teto salarial — o maior valor que os funcionários públicos de todas as carreiras em todos os poderes deveria receber —, mesmo tendo passado de R$ 33 mil para R$ 39 mil, é o piso no próprio Judiciário. “Tem algum juiz no Brasil que ganha menos do que um ministro do STF?”. Ele sabe que os levantamentos feitos pelo Conselho Nacional de Justiça — uma luta quase solitária da ministra Cármen Lúcia — mostraram a farra salarial na Justiça escondidas em caixas-pretas país afora.
Mesmo assim, Toffoli insiste em um argumento que não para de pé: “A lei que o presidente Temer sancionou é para a magistratura federal, não para a estadual”. Alguém tem dúvida de que ela vai beneficiar todos os juízes brasileiros no país inteiro, o famoso efeito cascata? Segundo Toffoli, com outras categorias reivindicando e conseguindo iguais reajustes, “o fato é que nós temos de redefinir essa questão relativa ao teto”.
Parece mera desculpa. Se fosse consistente, a redefinição do teto salarial, pondo fim a seu efeito cascata em todo os poderes, deveria preceder esse reajuste que provoca um aumento generalizado e um rombo estimado em R$ 4 bilhões nas contas públicas. O fato é que toda vez que pega mal os aumentos que as cúpulas dos poderes se autoconcedem volta a pauta a tal redefinição no teto. Por pouco tempo. Logo cai de novo no esquecimento.
A conferir.